Em um cenário global, a histórica trajetória do Ajax continua. Nem de longe é um clube pequeno ou irrelevante – sua importância cultural é extrema -, mas a estrutura moderna do futebol faz com que sua possível ida para a final da Champions League seja marcante. É um exemplo de como elencos bem pensados e trabalhados por um técnico coerente podem superar expectativas independente do contexto.
Outro exemplo é o Tottenham – que, apesar de ser derrotado em casa, ainda está vivo e conta com um treinador ainda mais brilhante.

Não é novidade que Mauricio Pochettino vive no radar de gigantes europeus e os motivos são claros. No norte de Londres, ele praticamente não tem como montar um plantel tão balanceado quanto gostaria e citei acima.
Daniel Levy, dono e presidente do clube, é uma das figuras mais duras do esporte quando o assunto é negociação e o próprio crescimento interno reduziu as possibilidades financeiras a curto prazo.
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Assim como a fase que o rival local Arsenal passou com a construção do Emirates Stadium, os Spurs tiveram que segurar ao máximo os cofres devido aos investimentos em seu novo estádio.
É visível o retorno que o espetacular Tottenham Hotspur Stadium trará, mas a maior parte será a médio e longo prazo. Por enquanto, o resultado é esse: estamos falando do único da história da Premier League a não ter contratado um jogador durante toda a temporada.
A atual, em que se manteve na sombra de Manchester City e Liverpool até março e com uma vitória por 2 gols de diferença em Amsterdam estará na final da Uefa Champions League.
Competição que participará pela quarta vez seguida em 2019/20, se tornando frequente em jogos de alto calibre e tomando o lugar de Manchester United, Chelsea e Arsenal. Tirando o primeiro, que já estava na decadência pós-Ferguson, os outros dois estavam acima dos Lilywhites quando Pochettino assumiu.

Até compreensivelmente, dado a disparidade econômica – que costuma definir os resultados no fim das contas. Mas a inteligência inverteu a balança. Em pouco menos de cinco anos, o argentino confirmou os bons sinais que deu no Espanyol e no Southampton e faz um trabalho digno de muitos elogios.
Criou uma equipe híbrida, capaz de atuar em vários sistemas e estratégias, se especializando em alterações positivas durante as partidas. Existem princípios, mas a estrutura pode mudar e o desempenho geralmente se mantém no alto. É isso que possibilita a gestão de um grupo tão enxuto e escasso de qualidade em certas áreas.
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As opções de meio-campo, tanto na proteção quanto na construção das jogadas vindo de trás, não surpreenderiam se fossem do 10º colocado do Campeonato Inglês. Trippier é um lateral capacitado e que se mostrava ótimo ofensivamente desde os tempos de Burnley, na Championship, mas toda peça tem um teto. E o dele certamente está bem abaixo de semifinais do melhor torneio do mundo.
Rose já passou por vários altos e baixos e Sánchez não se firmou como esperado. Vertonghen ficou 95 dias no departamento médico, Alli teve cinco lesões, Kane não joga desde o início de abril (já havia ficado 40 dias fora entre janeiro e fevereiro) e Son não esteve disponível por um mês, devido à Copa da Ásia.
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Vale lembrar também que tiveram uma casa temporária em Wembley, por arrastados um ano e nove meses.
Mauricio, vindo como apenas uma promessa e ainda sem se consolidar no cenário continental, teria muitas ‘desculpas’ se fosse marcado por altos e baixos. É claro que nem tudo é perfeito e algumas arestas ainda devem ser aparadas – são apenas cinco vitórias nos últimos 15 jogos, por exemplo -, mas os feitos se sobressaem amplamente aos pequenos deslizes.
As condições não são precárias – pelo contrário -, mas com todos esses asteriscos o normal passaria longe de se classificar para a Liga dos Campeões com uma rodada de antecedência e estar na semifinal da mesma competição.
Levando tudo isso em consideração, os Spurs teriam uma perspectiva de atingir tal nível para daqui alguns anos. Mas estão vivenciando agora. Faltam títulos? Há poucos anos o Tottenham era motivo de piada se pensava em brigar por coisa grande.
Agora, questionam os métodos do staff e o caráter dos jogadores se continuam sem levantar um troféu. Um elemento importante da discussão, sem dúvidas, porque geralmente nada supera taças na memória do torcedor. Mas podem perguntar pra qualquer um se estão orgulhosos e terão a mesma resposta. É óbvia.