Cada vez se fala que a bolha vai estourar e, cada vez, isso não acontece. A Premier League acabou de fechar um novo negócio de direitos de transmissão, ganhando mais um aumento. Vão ter rios de dinheiro pelo menos até o fim da década.
Tem um contexto aqui que vai além do futebol e revela mais sobre o cenário da mídia. Num mundo fragmentado, a televisão tradicional perdeu bastante da sua capacidade de alcançar audiências enormes com o mesmo produto — com a exceção de esporte ao vivo, que essencialmente quer dizer futebol.
Conclusão — relativamente o futebol está ganhando em importância midiática, daí o aumento de 4% no preço de direitos de TV domésticos, um mercado que muitos enxergavam como saturado.
É impressionante como o futebol inglês levou tempo para virar um evento para a televisão. A Copa do Mundo percebeu o seu valor como evento da mídia antes do Mundial do México em 1970. O futebol de clubes levou pelo menos mais 25 anos para chegar num patamar parecido.
Durante décadas, reinava um sistema de compactos, com os melhores momentos de alguns jogos mostrados ou no sábado à noite ou domingo à tarde. Estava precisando da aparência de um novo canal especializado para dedicar o espaço e os recursos para a transmissão do campeonato local e, desde o surgimento da Sky em 1992, estamos vivendo num mundo diferente.
A consequência negativa disso é o impacto em cima do torcedor dentro do estádio. Já houve banqueiros com a calculadora na mão chegando à conclusão que tal torcedor não tem grande relevância num cenário onde a televisão e o patrocínio geravam muito mais grana. São os idiotas que sabem o preço de tudo e o valor de nada.
Tira o torcedor do estádio — a pandemia mostrou isso claramente — e o evento não tem o mesmo apelo. O torcedor dentro do estádio fornece o ambiente e serve para chamar a audiência da televisão com a sua paixão e a sua convicção que o jogo se trata de um evento importante, digno do tempo de telespectador.
O torcedor dentro do estádio é, então, uma parte fundamental da engrenagem da indústria. Mas sofre com a nova realidade. A tabela dos jogos — especialmente os horários — agora obedece aos critérios da televisão. Antes era fácil — o jogo começava às 15h (horário local) de sábado. Agora pode ser em qualquer horário de sexta até segunda, pode mudar, pode ser num horário em que a torcida visitante não vai ter mais trens para voltar para casa.
Tudo bem, podemos concluir, faz parte e a gente tem que pagar algum preço para a qualidade do espetáculo contemporâneo.
Ser uma inconveniência para o torcedor é uma coisa. Maltratar dentro do estádio é outra — e tenho a opinião de que é justamente isso que faz o VAR.
Ficou mais que evidente que o VAR é incapaz de cumprir a promessa inicial dos seus advogados. Não acaba com as polêmicas e nunca vai — tantas decisões no futebol tem um componente subjetivo inevitável.
Claro, tem momentos quando corrige uma injustiça. Mas a qual custo? Esfria tanto o jogo, não é bom para o espetáculo, pode criar problemas para os músculos dos atletas, mas principalmente deixa o torcedor com cara de idiota, esperando as deliberações demoradas de um jogo que conquistou o mundo por causa da sua fluidez e simplicidade.
O VAR transforma o torcedor do estádio do futebol num membro de uma audiência de estúdio de televisão. Não importa quanto a televisão está pagando, não acho que isso vale a pena.