O jogo do domingo entre Luton Town e Manchester City trouxe lembranças, especialmente até a virada, de uma partida entre esses mesmos times 40 anos atrás.
Foi em maio de 1983, última rodada do campeonato, e o Luton viajou pelo norte precisando ganhar para se manter na primeira divisão. Conseguindo, quem ia cair….. era o Manchester City!
Acabou sendo um jogo para a história, um dos mais tensos que testemunhou o Maine Road, a velha casa do City. A maioria das chances eram do City, mas, faltando quatro minutos, o Luton marcou o gol que silenciou a torcida e deixou o seu técnico, David Pleat, fazendo uma famosa dança de alegria pura no apito final.
Estádio de “ontem”, jogadores de “ontem”. Todos os titulares, nos dois lados, eram britânicos. A única exceção foi o cara que saiu do banco para fazer o gol — o defensor ou meio-campista sérvio Radomir Antic.
Depois virou técnico, e conseguiu dirigir Real Madrid e Barcelona — e também Atlético de Madrid, onde trabalhou com mais sucesso. Faleceu em 2020, deixando um grande currículo — mas acredito que tem poucas coisas na sua vida profissional tão dramáticas quanto o seu gol que rebaixou o Manchester City.
A partir de 1983, começou a fazer um ioiô entre a primeira e segunda divisões e até cair para a terceirona.
Mas olhe agora. Quarenta anos depois de sofrer o gol de Raddy Antic, hoje em dia, pela primeira vez, o City tem o direito de se chamar campeões da Europa — e agora vai em busca do título mundial. E pode ir sem a pressão que prejudicou a sua atuação e dificultou o triunfo sobre a Inter de Milão alguns meses atrás na final da Ligas da Campeões.
Porque ganhar aquele jogo foi visto por todos — dentro do clube e fora — como o grande objetivo, a confirmação do sucesso de um projeto. O Mundial seria um extra agradável — bom para ganhar, mas nenhuma tragédia se perder.
Sei que isso vai irritar bastante muitos brasileiros, que até acham que os europeus trabalham para disfarçar o seu desejo para conquistar essa taça. Não é bem assim, embora tenha diferenças.
Em linhas gerais, o sul da Europa preza o Mundial muito mais que o norte, o que é fácil explicar. Os clubes da Espanha, Portugal e Itália têm lembranças positivas dos primeiros anos do Intercontinental, no início da década de 1960, quando os jogos eram maravilhosos.
O norte tem uma visão terrível dos anos depois, quando a Libertadores caiu sobre o domínio do futebol argentino na sua fase mais cínica. Logo os clubes da Inglaterra e Alemanha chegaram à conclusão que o Mundial não estava valendo a pena — e nunca o torneio, em qualquer formato, conseguiu empolgar.
Hoje em dia, claro, o técnico do City vem da Espanha (ou para ser mais específico, Catalunha), e Pep Guardiola e vários dos seus jogadores têm mais noção da importância do Mundial que os ingleses. Como sempre, ele quer ganhar.
Mas ele não vai ser cobrado pela mídia inglesa da mesma forma que acontece num jogo grande da Champions, ou até na Premier League, onde parece às vezes que ele fica se torturando na busca para achar soluções táticas.
Está mais vulnerável que normal e menos incisivo. Uma pausa faria bem. Ganhando ou perdendo o Mundial — e depois das 10 vitórias consecutivas, pode ser a hora de o campeão europeu não levar o título — é possível que o intervalozinho, a viagem para outros ares — seja bom para o City, e que volte refrescado para disputar o título inglês.