Deve ser um momento muito difícil para ser um torcedor do Everton.
A notícia que o clube foi punido com a perda de mais dois pontos traz uma certeza — o clube está, sim, numa luta contra o rebaixamento. Fora disso, é incerteza geral — sobre a aquisição pela 777 Partners, a mudança para um estádio novo e o futuro geral de um clube com uma tradição maravilhosa.
Pior é que o declínio não é somente absoluto — e também relativo, de uma maneira especialmente dolorosa. Porque é só olhar para o outro lado de Stanley Park para ver uma visão de sucesso, vestida de vermelho — que tem, além da rivalidade local, um aspecto que deixa o torcedor do Everton bem raivoso.
Everton e Liverpool são vizinhos muito próximos. Durante muitos anos, o Everton era a primeira força da cidade. Começou a mudar no final dos anos 1950, quando o lendário técnico Bill Shankly chegou no Liverpool. Mas mesmo assim, o Everton disfrutava de momentos grandes. Era, com muito orgulho, “a academia” ou “a escola da ciência”.
O último período triunfal do Everton começou exatamente 40 anos atrás. Ganhou a FA Cup em maio de 1984 com uma vitória fácil em cima do Watford. Foi o primeiro título em 14 anos, e iniciou uma grande fase. Chegou na final da Copa nas próximas duas temporadas. Perdeu aí, mas ganhou o campeonato em 1985 e 1987.
Para te dar uma ideia, Gary Lineker passou uma temporada no clube, imediatamente antes de virar o artilheiro da Copa do Mundo de 1986. Depois defendeu e ganhou títulos com o Barcelona, e também conquistou a FA Cup com o poderoso Tottenham Hotspur. Mas ele não tem dúvidas. O melhor time da sua carreira foi o Everton de 1985-86.
Em 1985, o Everton ganhou o Campeonato Inglês, e também se mostrou pronto para voos mais altos. Levou a Recopa, depois de uma campanha tão sólida que quase não levou gols. Eliminou o Bayern de Munique nas semifinais e, com uma certa facilidade, venceu o Rapid de Viena por 3 a 1 numa final na Holanda.
Estava tudo pronto para o desafio supremo, a taça conhecida hoje em dia como a Liga das Campeões. Naquela época, eram somente os campeões dos campeonatos quem participavam. Era um sonho — mas para Everton, o sonho durou menos que 15 dias.
Duas semanas depois da final da Recopa, veio a decisão da Liga dos Campeões. A data é inesquecível para quem acompanhava. O jogo foi na Bélgica, no estádio Heysel de Bruxelas. Um total de 39 torcedores, quase todos italianos fãs da Juventus, perderam as suas vidas numa confusão onde houve falhas de segurança básicas — mas a confusão não teria acontecido sem as ações dos torcedores do Liverpool.
Os hooligans ingleses já estavam causando muitos problemas, mas isso foi demais. Uma punição foi necessária — então, todos os clubes ingleses ficaram impedidos de participar nas taças continentais. Por causa do comportamento da torcida rival, o Everton perdeu o seu lugar na competição mais cobiçada.
A decepção foi tão grande que um declínio foi inevitável. O time ficou forte durante mais duas temporadas, mas logo caiu em rendimento. Depois de 1987, nunca mais chegou perto de ganhar o campeonato e pouco tem feito nas taças continentais nas raras ocasiões em que participou.
A tragédia de Heysel representa um momento “antes e depois” na vida do Everton — e dá para entender uma certa amargura da torcida quando contempla a situação do seu clube e faz contraste com o Liverpool ainda na briga por títulos.