Stan Bowles: Quem foi o ‘craque Neto’ inglês dos anos 1970

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Imagino que tenham jovens surpresos com o tamanho do perfil do ex-jogador Neto dentro da mídia esportiva no Brasil, e especialmente São Paulo. O Brasil possui ex-atletas com mais títulos ou mais jogos pela Seleção

Como, então, a voz de Neto comanda tanto espaço? A resposta é fácil. 

O futebol nunca é somente sobre o que você faz. Se futebol fosse somente números, seria bingo. O futebol também é sempre sobre como você faz. E Neto pertencia a um certo tipo do jogador — às vezes frustrante, muitas vezes cativante — que é talento puro, que transforma o campo numa tela branca onde de vez em quando vai pintar uma obra mestre.

Esse tipo de jogador não quer se conformar e briga para mostrar que merece o privilégio de fazer tudo da sua própria maneira. Ele faz do futebol um sonho de liberdade e vira ídolo justamente porque está vivendo a vida que o torcedor gostaria de ter.

O futebol inglês teve um surto desse tipo de jogador no início dos anos 1970 (os pais ingleses de Neto?) e a morte de um deles no fim da semana passada ainda está provocando lágrimas em pessoas de uma certa idade. De todos esses não conformistas talentosos, Stan Bowles era talvez o mais querido e morreu uma lenda com 75 anos.

Stan fazia parte da primeira geração de jogadores ingleses a ter um pouco de dinheiro — ainda uma miséria em comparação com hoje em dia, mas bastante mais que os caras de 10 anos antes. Ele e os outros incorporaram aspectos da contracultura, com os seus cabelos longos servindo como um anúncio que se tratava de livres espíritos. 

Era de Manchester e apareceu primeiro no grande City do final dos anos 1960. Mas foi na década seguinte que achou o seu lar espiritual quando foi para Londres para jogar no Queens Park Rangers.

Não houve tanta pressão. Na melhor dos hipóteses, o QPR briga para ser a quinta força do capital, então não tinha grande expectativa de glória. Mas com Stan Bowles organizando o ataque, o QPR ficou muito, muito perto de ser campeão em 1976. O pé esquerdo dele era uma vara mágica, estava cheio de imaginação e malícia deliciosa.

Não era um atleta. Naquele mesmo ano de 1976 , Stan participou de um famoso programa de televisão chamado “Superstars” — um tipo de Jogos Olímpicos onde estrelas de vários esportes competiram juntos. Ele foi um desastre. 

Ganhou a pior pontuação na longa história do programa. Mas, em um momento quando, por acaso, uma bola apareceu, Stan deixou boquiabertos os boxeadores, velocistas e pilotos de Fórmula 1 com a sua capacidade de dominar e brincar com ela.

Não era um atleta, mas era um artista.

Irresponsável demais pela seleção? Talvez. Jogou somente cinco vezes, sem brilhar. Marcou um gol, contra o País de Gales, num jogo emblemático. Stan sabia que as fornecedoras de material esportivos iam pagar ele para usar as suas chuteiras. Viu a oportunidade. Usou uma chuteira de uma empresa, e uma de outra e ganhou duas vezes.

Duvido que ficou muito tempo com a grana. Adorava apostar nos cavalos — foi visto muitas vezes na loja de apostas faltando poucos minutos para o jogo, e durante as partidas aproveitava de uma pausa para pedir à torcida o resultado da corrida.

Bem, a corrida de Stan Bowles acabou. As lembranças nas mentes e nos corações da torcida não vão acabar nunca. Os torcedores do Queens Park Rangers já estão levantando fundos para colocar uma estátua de Stan lá no estádio — onde, com certeza, vai ser visitado por fãs de outros clubes. 

Stan Bowles era da gente.

Tim Vickery
Tim Vickery

Tim Vickery cobre futebol sul-americano para a BBC e para a revista World Soccer desde 1997, além de escrever para ESPN e aparecer semanalmente no programa Redação SporTV. Foi declarado Mestre de Jornalismo pela Comunique-se e, de vez em quando, fica olhando para o prêmio na tentativa de esquecer os últimos anos de Tottenham Hotspur.