Thomas Tuchel na seleção inglesa: Está aí uma notícia que pode nos preocupar

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Pela terceira vez na história, a seleção inglesa terá um treinador não-britânico. O alemão Thomas Tuchel foi escolhido para o cargo uma vez que o tempo passava e o interino Lee Carsley não parecia pronto para segurar a onda até que alguém maior pudesse aparecer — leia-se Pep Guardiola, mesmo que sem qualquer garantia.

Tuchel definitivamente não é unanimidade (caso contrário estaria empregado num grande clube neste momento), mas essa é uma notícia que pode nos preocupar — seja você brasileiro ou apenas alguém que gostaria de ver outra seleção vencendo a próxima Copa do Mundo.

Que o meu parceiro de coluna Tim Vickery me perdoe, mas eu não quero que o “futebol vá para casa” 😜

A Inglaterra já era forte com Gareth Southgate a ponto de ter chegado em duas finais de Eurocopa (2021 e 2024) e mais uma semifinal de Copa do Mundo (2018). Em 2022, no Catar, caiu nas quartas para a vice-campeã França com Kane desperdiçando um pênalti.

Mas parecia ser consenso que faltava algo. Claro, o troféu pode não ter vindo por detalhes, em mata-mata é assim. Mas Southgate não conseguiu convencer os críticos do futebol praticado por sua seleção que deveria ser mantido no cargo para mais um grande torneio, enquanto o país desfruta da sua melhor geração. Eu também tinha essa sensação ao assistir aos jogos.

Já falamos aqui nesta coluna da abundância de talento inglês. Qual seleção no mundo hoje tem nomes consolidados em grandes clubes como Jude Bellingham, Phil Foden, Harry Kane, Cole Palmer, Bukayo Saka, Alexander-Arnold, Declan Rice?

E mais uma penca de bons jogadores ou muito promissores em John Stones, Kyle Walker, Kobbie Mainoo, James Maddison, Ollie Watkins, Rico Lewis…?

Há quantidade e qualidade. Ok, Tuchel é alemão e isso pode soar como um acinte pela rivalidade entre os países e a resistência dos costumes tradicionais, mas a verdade é que a FA precisa se preocupar com o campo.

Ela considera que suas chances com um treinador desse quilate são maiores do que apostar em outro inglês para o cargo.

Como dizer que está errada?

  • O último inglês a conquistar um troféu europeu foi Bobby Robson com o Barcelona em 1997;
  • O último inglês a conquistar o Campeonato Inglês foi Howard Wilkinson com o Leeds United em 1992 (antes da criação da Premier League!);
  • O último inglês a conquistar a FA Cup foi Harry Redknapp com o Portsmouth em 2008;
  • E o último inglês a conquistar a Copa da Liga foi Steve McClaren com o Middlesbrough em 2004.

Além disso, seria uma tremenda hipocrisia não levar em conta que a seleção inglesa feminina foi campeã da Eurocopa em 2022 com a holandesa Sarina Wiegman no comando.

Seleção feminina da Inglaterra comemora título da Eurocopa em 2022
Seleção feminina da Inglaterra comemora título da Eurocopa em 2022 (Foto: IMAGO/PA Images)

Pode não dar certo, evidentemente. Tuchel conquistou a Liga dos Campeões com o Chelsea em 2021, tem no currículo outros grandes títulos na França e Alemanha, mas no futebol de seleções a fórmula não é tão preto no branco. O vencedor Luis Enrique não levou a Espanha tão longe quanto Luis de la Fuente, que comandava a base e agora é campeão europeu.

O mesmo vale para a Argentina com o antigo auxiliar Lionel Scaloni. Ele é o atual bicampeão da Copa América e também da Copa do Mundo. Ou Joachim Löw na Alemanha.

A própria Inglaterra já viveu essa sensação com o italiano Fabio Capello, dotado de enorme currículo, e que só chegou às oitavas de final na Copa de 2010 — eliminada curiosamente para a Alemanha. A história também mostra que nenhum treinador estrangeiro foi campeão do mundo.

Tuchel vem de um trabalho decepcionante no Bayern (foi varrido pelo Bayer Leverkusen na Alemanha), e não conseguiu algum clube à altura do que imaginava na ciranda de técnicos durante o verão europeu.

Estava desempregado e, portanto, a oportunidade surge como ouro para voltar a subir nas prateleiras dos treinadores. O contrato de 18 meses (o trabalho começa oficialmente em janeiro) põe enorme peso na Copa, mas não havia como fugir muito disso.

Mas não é isso que me preocupa

Há argumentos de todos os lados, mas, ainda assim, a nomeação faz bastante sentido. E eu realmente acho que a Inglaterra pode ter se aproximado um pouquinho mais do título.

O trabalho no Chelsea tem o peso para convencer qualquer um. Encontrou terra arrasada com Frank Lampard, estancou a sangria, montou um time extremamente competitivo sem muita grife e derrotou com autoridade o City de Guardiola na decisão da Champions. No ano anterior, já havia ficado no quase com o Paris Saint-Germain.

Tuchel acabou demitido do Chelsea pelo novo dono Todd Boehly em setembro de 2022. Talvez tenha ficado maior depois que o clube patinou com Graham Potter, novamente Frank Lampard e Mauricio Pochettino. O italiano Enzo Maresca enfim parece ter sido um acerto.

Tuchel tem uma boa reputação como estrategista e um cara que sabe lidar com a imprensa. Por outro lado, sua fama de colecionar conflitos talvez seja a resposta para não ter durado tanto nos clubes.

E isso, claro, é preocupante. É provável que Tuchel faça inimigos e mexa na zona de conforto da seleção inglesa. Pode ser que alguns atletas sejam afastados, e novos nomes surjam para rodear aqueles que notoriamente estão acima da média.

Harry Kane, que viveu grande fase com ele no Bayern, certamente estará presente. O resto a gente vai saber a partir de janeiro.

Será um bom casamento para acompanhar.

Harry Kane e Thomas Tuchel já trabalharam juntos no Bayern de Munique
Harry Kane e Thomas Tuchel já trabalharam juntos no Bayern de Munique (Foto: IMAGO/PA Images)
Victor Canedo
Victor Canedo

Victor Canedo trabalhou por 12 anos como repórter de futebol internacional no Grupo Globo. E até hoje mantém o hábito de passar as manhãs e tardes dos fins de semana ouvindo a voz de Paulo Andrade. Para equilibrar a balança dos colunistas deste site, é torcedor do Arsenal desde Titi Henry.