Sylvinho: o plano do Manchester City e o grande segredo de Guardiola

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O Manchester City tem a chance de vencer a sua primeira Champions League neste sábado (10), quando enfrenta a Inter de Milão. Há quem torça para o City na final da Liga dos Campeões por ser admirador de Pep Guardiola. Existem os que anseiam por mais uma equipe com a tríplice coroa. Há, também, aqueles que creem no projeto de longo prazo que existe no clube. Em entrevista exclusiva à PL Brasil, Sylvinho, ex-jogador do City e atualmente técnico da seleção da Albânia, mostrou que se encaixa em todos os casos.

Os Citizens têm motivos para estarem animados: o time já esteve na final há pouco tempo, em 2021; Guardiola tem vasta experiência na competição e em decisões, e há a possibilidade de conquistar a tríplice coroa. Sylvinho foi comandado pelo catalão no Barcelona – com quem conquistou o triplete em 2009 – e revelou detalhes de sua metodologia inovadora, mas não deixou de lado a exaltação ao projeto do City.

— Eu confesso: foi uma experiência extraordinária da minha vida – disse o ex-lateral-esquerdo sobre seu tempo em Manchester.

O planejamento claro do City

Sylvinho chegou à Inglaterra justamente depois de conquistar a tríplice coroa no Barcelona. Ele revelou que o planejamento do clube foi sóbria desde o início e o longo prazo sempre esteve em vista: quando foi contratado, o plano da direção do City era justamente levar jogadores experientes e campeões para encorpar o time e levar esse tipo de mentalidade ao clube.

— Esse resultado depois de praticamente 15 anos realmente ocorreu. Aquilo que eu ouvia com 36 anos – exaltou o atual treinador, que hoje tem 49.

O antigo lateral de Corinthians, Arsenal e Barcelona bateu muito na tecla do planejamento. O caminho a ser trilhado pelo City parecia muito linear para a direção, como se nunca estivesse longe de ser concretizado. Não era “história para boi dormir”, mesmo que ambiciosa demais aos olhos iniciais.

Sylvinho em ação pelo Manchester City - icon Sport
Sylvinho em ação pelo Manchester City – icon Sport

Para ele, que participou do começo da história que se tornaria multicampeã no clube, o City é um dos poucos, ou o único, a conseguirem se converter de uma forma “extraordinária”:

— O que eu ouvia não era uma história que estavam simplesmente te contando. Foi planejamento.

Guardiola: o professor que mudou tudo

Sylvinho viveu os primeiros momentos de Guardiola como treinador do Barcelona, no trabalho que encantou o mundo e é objeto de estudo até hoje. Ele lembra que houve uma revolução quando o ex-meio-campista assumiu: alterou a rotina, trocou o CT e levou uma forma de ensinar futebol que nunca foi vista antes pelo então lateral.

Um dos primeiros que eu vi trabalhar tanto o seu time como o adversário de uma forma muito minuciosa com os atletas (com vídeo). E ele fazia isso ‘repartido’: tem momentos de parte defensiva que não é necessário todos estarem (vendo), por exemplo. Ele conseguia separar isso bem sem causar nenhum tipo de confusão – disse o ex-comandado de Guardiola.

Dentro de campo, os treinamentos eram sempre muito específicos e mostravam, quase que com um sexto sentido, aquilo que iria ocorrer no jogo. “O desgaste deles (comissão técnica) é gigante, agora eu percebo mais do que nunca”, brincou o atual treinador da Albânia, que há quatro anos trabalha como técnico principal.

— Não à toa que em 2008/09 ganhamos o triplete. Foi a minha melhor temporada como atleta e acredito que, por enquanto, tenha sido a melhor dele, a não ser que ganhe o triplete agora com o City – indicou Sylvinho.

Sylvinho em ação pelo Barcelona - Icon Sport
Sylvinho em ação pelo Barcelona – Icon Sport

A evolução do catalão como treinador teve diferentes episódios. Desde a temporada de estreia marcante, Guardiola passou por um time com seis meio-campistas e sem atacantes, jogar com uma primeira linha de três, jogar sem nenhum zagueiro, escalar quatro zagueiros de ofício e quebrar o paradigma de “não conseguir ter sucesso com um centroavantão”.

Hoje com olhar de técnico, Sylvinho destacou a mudança que o colega de profissão fez com Bernardo Silva – antes um ponta pela direita e, agora, um meio-campista multifacetado que jogou até mesmo de lateral-esquerdo. As laterais, inclusive, são ponto de destaque do repertório do treinador, e o ex-jogador da posição explicou:

— Ele tem uma frase: ‘do jeito que atacamos, defendemos’. Isso quer dizer que se ele projetar demais os laterais ele vai tomar muito contra-ataque e vai defender só com dois zagueiros. ‘Se eu tenho outros atletas com capacidades técnicas individuais muito melhores, eu prefiro que o meus laterais construam por dentro, porque são ótimos nisso também, e estejam mais numa preventiva defensiva’ – refletiu Sylvinho.

É um conjunto que ele trabalha e nós estamos falando de uma vírgula, mas imagina o que passa na cabeça de um gênio desse“, indagou. Como treinador, ele também entende que, mais do que o dedo de quem tem a prancheta, a necessidade dos jogadores estarem em altíssimo nível para acompanhar o que Guardiola quer também merece seu aplauso.

A importância de Roberto Mancini

Roberto Mancini foi o primeiro a assumir o projeto “rico” do City efetivamente. Ele chegou como um tricampeão italiano e comandou os Citizens de 2009 a 2013, conquistando três títulos – incluindo a primeira Premier League do projeto.

Mancini comandando o City em 2012 – Icon Sport

Sylvinho criou grande relação com o italiano, que foi crucial não só para o início da nova era dos ingleses, como o seu futuro como treinador. Como jogador experiente, era o brasileiro que “dava dicas” para o treinador e agiu muitas vezes como mais um auxiliar em campo.

— Eu tinha uma relação muito boa com o Roberto Mancini e desenvolvi parte da minha carreira futura era um atleta. Ele pedia algumas ajudas para mim como atleta experiente, de conhecer o grupo, de conversas. ‘Vem aqui na minha sala, o que está acontecendo aqui?’. Mas conversas boas, não ‘qual é o problema?”. É ‘por que isso aqui funciona assim? Aquilo ali, por que daquele jeito?’ – revelou Sylvinho.

Ele lembra de um exemplo evidente da “falta de experiência” naquele contexto: em pleno inverno rigoroso na Inglaterra, o italiano queria dar treinos de dois períodos e quase foi “pego pelo pescoço” pelo elenco.

Ele chegou em dezembro, em um frio violento, nevando e faz um (treino de ) dois períodos. Ah, os jogadores queriam matar. E ele fez um treino longo, aí os atletas ficaram desesperados – relembrou em sorrisos.

O feedback que Mancini pedia de Sylvinho o ajudou a estreitar uma relação proveitosa de técnico-jogador que depois viraria de treinador principal-auxiliar, quando o brasileiro foi convidado pelo italiano para trabalhar na Inter de Milão.

Levando o City até a Albânia

Depois de experiências como auxiliar no Corinthians, Inter de Milão e seleção brasileira. Sylvinho assumiu seu primeiro trabalho como treinador principal no Lyon, em 2019. Foram 11 jogos, testes e uma saída precoce, que o levou ao Corinthians – que será esmiuçada na segunda parte desta entrevista exclusiva com a PL Brasil. Em janeiro de 2023, aceitou o convite para ser o novo técnico da seleção albanesa.

Sylvinho comandando a seleção da Albânia – Icon Sport

“Estava em um jantar com um amigo em Milão e ele me disse: o presidente da Federação da Albânia está aí, estão sem treinador. Não te interessa?”, foi assim que o técnico deu início ao que seria seu primeiro trabalho principal no futebol de seleções. E são só elogios.

Atualmente morando na capital do país, Tirana, Sylvinho revelou uma surpresa positiva com as instalações da seleção, a situação do projeto e as condições que lhe foram dadas. Pôde levar o braço direito como auxiliar, Doriva, e finalmente tirou do papel o plano de trabalhar com Pablo Zabaleta, ídolo recente do Manchester City.

— Nós já estávamos há dois ou três anos conversando sobre algumas possibilidades e do jeito que nós queríamos: morar aqui. É a primeira vez que um treinador vem morar na capital, em Tirana. O Zabaleta faz um trabalho diferenciado, assim como eu fazia na seleção brasileira – disse o técnico.

Quando era auxiliar de Tite, Sylvinho morava em Milão. Auxiliar do ex-companheiro, Zabaleta mora em Barcelona e está mais próximo do raio de observação de muitos dos atletas da seleção albanesa. A possibilidade de trabalhar com seus companheiros de longa data e em um cenário “mais calmo” trouxe tranquilidade: “Eu gostei de tudo aquilo que foi me mostrado e isso passa confiança”.

Guilherme Ramos
Guilherme Ramos

Jornalista pela UNESP. Escrevi um livro sobre tática no futebol e sou repórter da PL Brasil. Já passei por Total Football Analysis, Esporte News Mundo, Jumper Brasil e TechTudo.

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