Antes da era Gareth Southgate, a seleção inglesa foi eliminada da Euro de 2016 depois de perder para a Islândia. Agora, considerada uma das favoritas para o torneio na Alemanha, a Inglaterra de Southgate pega a Islândia num amistoso que vai ajudar o técnico a decidir as últimas vagas no seu elenco.
Os dois jogos contra o mesmo adversário servem como uma mostra do valor do trabalho do Southgate. Sob o comando de Roy Hodgson, a Inglaterra não passou da fase de grupos na Copa de 2014 e, dois anos depois, caiu para uma nação de menos de 400 mil almas corajosas. A retrospectiva com Southgate é muito melhor. Por quê?
Primeiro, porque o futebol inglês está conseguindo produzir talentos, especialmente nas posições ofensivas.
Segundo, porque ele tem bastante conhecimento desses talentos.
Antes de assumir o seu cargo atual, ele passou três anos como técnico da seleção sub-21. Previamente, o desempenho com o clube foi o único critério para a convocação. Southgate sempre está avaliando o progresso com as categorias menores. Quem se sai bem dentro do processo das seleções da base leva vantagem.
Isso é novo na Inglaterra.
Let's go, #ThreeLions! ? pic.twitter.com/NZreb4Xuor
— England (@England) June 3, 2024
Terceiro, porque jogou mais de 50 vezes com a seleção inglesa. Era um meio-campista transformado em zagueiro, um jogador quieto, mas correto — o tipo que é obrigado a pensar bem para operar na elite. O futebol das seleções é diferente e ajuda ter um técnico que conhece as pressões de um torneio.
E quarto, porque se trata de um homem de inteligência e decência. O seu cargo não é fácil, especialmente no cenário político dos últimos anos. A força do nacionalismo vem crescendo, que inevitavelmente leva a uma pergunta profunda — quem deveria ser considerado parte da nação?
Isso obviamente tem implicações raciais.

Por um lado, o Southgate é um tradicionalista — um garoto da classe média que é confortável ficando em pé para o hino nacional. Por outro lado ele tem uma sensibilidade antirracista e consegue fazer uma ligação com os jovens que não enxergam nada glorioso em contas dos velhos dias do Império Britânico.
Então, Gareth Southgate agrada a todos?
Claro que não. Trata-se de um técnico do futebol e nunca na história de tal profissão houve um que fosse unanimidade.
A crítica mais comum sobre Southgate é que ele é cauteloso demais. Essa visão consegue ser, ao mesmo tempo, certa e errada.
Errada porque as pessoas não estão fazendo a adaptação necessária. Não é futebol de clubes, onde um grande time na Premier League está obrigado a buscar a vitória em todos os jogos. Primeiro, a seleção tem muito menos tempo para treinar.
Segundo, a dinâmica de um torneio é diferente. É um caso de passar de fase e depois enfrentar os jogos um por um. Futebol de seleções é necessariamente mais cauteloso que os jogos dos clubes.

Mas a crítica tem fundamentos porque, em determinados momentos, Southgate realmente parece sofrer de um excesso de cautela. O grande exemplo é a final da Euro três anos atrás, onde dava para atacar mais uma seleção italiana sem grande brilho. O time de Southgate pareceu ter medo de ganhar — e perdeu nos pênaltis.
E na última Copa do Mundo a Inglaterra fez um bom jogo contra a França nas quartas de final — mas sem inspirar a confiança de que iria ganhar. No fundo, a seleção inglesa parecia acreditar na superioridade dos franceses — a mesma reclamação que, como jogador, Southgate fez sobre a seleção inglesa contra o Brasil em 2002.
Agora não tem motivos para tantas dúvidas — a não ser, talvez, a falta de profundidade na posição de zagueiro. Esse pode ser o último torneio de Southgate com a seleção — e tenho a impressão que o seu reinado inteiro vai acabar julgado de acordo com o que acontecer nas próximas semanas.