As novidades que trazem muitas incertezas sobre futuro do Tottenham chegaram em péssimo momento

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O Tottenham anunciou que a a receita total do clube no ano encerrado em 30 de junho de 2023 foi de 549,6 milhões de libras (aproximadamente R$ 3,5 bilhões). É a primeira vez na história que a marca de meio bilhão é superada. Ótima notícia!

Mas o comunicado não parou por aí. O clube revelou prejuízo operacional de 86,8 milhões de libras (R$ 553,7 milhões). O motivo apontado foi um aumento de 21% nas despesas operacionais, incluindo um grande investimento no elenco após a chegada do treinador Ange Postecoglou no verão passado.

Com base nesses dados, o presidente Daniel Levy afirmou estar em conversas com possíveis investidores para vender uma participação nas ações do clube: “Para poder continuar investindo no time e em projetos futuros, é preciso ter um aumento significativo de capital”, completou Levy. Na Inglaterra, logo se levantou o questionamento se o clube estaria à venda. Levy se apressou para negar essa possibilidade.

Será que todos acreditam na palavra dele? Acho difícil. Essas novidades, que trazem muitas incertezas sobre o futuro do clube e do time, chegaram em um péssimo momento.

Dentro de campo, o Tottenham sofre gols. Muitos. Mais do que qualquer outro time que está entre as seis primeiras colocações. Conseguiu apenas DOIS clean sheets nos últimos 21 jogos. Mas, por incrível que pareça, apenas um setor manteve o nível de atuação que empolgou a todos no início da temporada: a defesa.

Guglielmo Vicario segue fazendo um milagre atrás do outro. Pedro Porro continua incansável, marcando e apoiando o ataque. A dupla de zaga Cristian Romero e Micky Van de Ven parece jogar junta há anos. Destiny Udogie, talvez o melhor lateral-esquerdo da liga nas dez primeiras rodadas, oscilou um pouco, cometeu algumas falhas, mas ainda é muito confiável.

Ange cumprimenta Richarlison em jogo do Tottenham (Foto: Icon sport)
Ange cumprimenta Richarlison em jogo do Tottenham (Foto: Icon sport)

A verdade, é que são cinco guerreiros. As linhas altas de Ange Postecoglou exige atenção o tempo todo. Nomes como Van de Ven e Udogie estão o tempo todo no mano a mano, disputando com os atacantes na corrida, sem ninguém na sobra. E, quase sempre, ganham a briga. Os muitos gols tomados não são culpa dos cinco defensores. Muito pelo contrário. Se não fossem eles, os números seriam ainda piores.

No meio-campo, impossível não falar de James Maddison. Nos 11 primeiros jogos da temporada, fez três gols e deu cinco assistências. Era o motor do time. Até aquele momento, estava em todas as listas de melhores jogadores da Premier League e contratações mais acertadas.

Só que aí veio a lesão no tornozelo na partida contra o Chelsea, em novembro. Mais de dois meses afastado. O time sentiu uma falta imensa do meia inglês. O esperado retorno finalmente chegou, mas Maddison não é nem sombra do que foi naquele início empolgante. Em nove jogos desde janeiro, apenas um gol e duas assistências. Contra o West Ham, quando o time precisava atacar, foi substituído aos 20 minutos do segundo tempo.

Bissouma e Maddison no Tottenham
Bissouma e Maddison no Tottenham. Foto – Icon Sport

Só que Maddison não é o único. Todos do trio de meio-campo que começou tão bem a temporada, caíram de produção. Yves Bissouma, além de ter colecionado expulsões e se ausentado para a disputa da Copa Africana, passou a errar passes bobos.

Parece não ter, pelo menos nesse momento, a intensidade de outrora. Pape Sarr virou reserva. E quem entrou no lugar dele foi Rodrigo Bentancur, outro que não repete o mesmo nível de atuação que mostrava antes da séria lesão que sofreu na temporada passada.

No ataque, a única boa notícia é Brennan Johnson. Mais uma vez, decisivo contra o West Ham. Depois de um início bem devagar com a camisa dos Spurs, chega a 12 participações diretas em 24 jogos. Foi titular em 19.

Já é um número maior do que ele conseguiu na temporada passada pelo Nottingham Forest (11). Ou seja, já dá pra dizer que ele está entregando o que o Tottenham esperava quando o contratou. Se pagou um valor alto demais (47,5 milhões de libras), é outra discussão…

Kulusevski pelo Tottenham (Foto: Icon Sport)

Dejan Kulusevski é o jogador que mais embicou para baixo em todo o elenco. É realmente difícil de entender. O melhor do ataque nas dez primeiras rodadas, agora dificilmente acerta um passe. Entrou aos 20 minutos da etapa final contra o West Ham, e foi logo errando um passe bisonho, de poucos metros, para o Son. A bola foi direto para a lateral. No último lance da partida, com o Tottenham desesperado em busca do gol da vitória, desperdiçou uma chance de contra-ataque incrível.

Nos últimos 13 jogos (em todas as competições), apenas um gol e uma assistência. Não à toa, virou banco. Só que, de novo, ele não é o único. Son tem oscilado nas últimas partidas. Segue sendo o mais importante, fazendo gols importantíssimos, mas parece carregar um peso muito grande nas costas. Sabe que precisa jogar bem todo jogo para o time funcionar. Contra o West Ham, pouco fez.

Richarlison vivia grande fase, mas se lesionou, e parece com dificuldade de voltar a estar 100%. Do lado do treinador, ou da comissão técnica em geral, passou da hora de resolver um grande problema: as bolas paradas. Todos os times têm trazido muita dificuldade ao Tottenham usando o mesmo artifício: colocando um jogador na frente de Vicario para impedir que ele chegue na bola.

Foi assim que o West Ham marcou o gol de empate nesta terça-feira. Everton, Manchester City (gol que causou a eliminação na FA Cup) e muito outros times tinham usado essa mesma tática. Já são DEZ gols tomados de bola parada nessa Premier League. E digo mais: a bola parada ofensiva precisa melhorar MUITO também.

Os torcedores do Arsenal têm comemorado quando o time consegue um escanteio. Isso porque já marcaram incríveis 13 gols dessa maneira. Se juntarmos com os gols saídos de cobranças de falta, são 18 gols (isso sem incluir pênaltis).

O Tottenham não faz nem sombra a isso.

Mas, importante dizer: tudo isso era mais do que esperado. Primeira temporada de um técnico que mudou COMPLETAMENTE a forma do time jogar. Altos e baixos vão acontecer. São muitos detalhes para acertar, problemas para consertar, e até peças para chegarem, para que o treinador consiga estabelecer a maneira de jogo que sonha.

É preciso muito mais do que nove meses de trabalho para conseguir atingir ao nível de excelência que a Premier League exige. Guardiola, Klopp, Arteta são prova disso. Mas, para o trabalho deles terem dado tão certo, precisaram contar com um clube estável e com dinheiro para investir. Depois do comunicado de hoje, tudo indica que o cenário que Ange terá na próxima temporada não será o mesmo.

Renato Senise
Renato Senise

Renato Senise é correspondente em Londres desde 2016. São mais de cinco temporadas cobrindo Premier League e Champions League. No currículo, duas Copas do Mundo “in loco”, além de entrevistas com nomes como Pep Guardiola, José Mourinho, Juergen Klopp, Marcelo Bielsa, Neymar, Kevin De Bruyne e Harry Kane.