As histórias da última passagem do Oldham pela elite inglesa

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Atualmente vivendo ostracismo na quarta divisão, o Oldham tem história para contar na Premier League. O Latics viveram bom momento no início dos anos 1990, chegando longe nas copas e disputando a divisão de elite, a tempo de participar da repaginada liga.

O mentor daquela última grande fase do clube da região da Grande Manchester foi o técnico Joe Royle, desde 1982 no cargo – era então o treinador mais longevo em seu posto no futebol inglês.

Royle foi um atacante histórico do Everton, campeão inglês em 1970 e artilheiro dos Toffees em várias temporadas. Mais tarde, defendeu ainda Manchester City (campeão da Copa da Liga em 1976 e vice do campeonato no ano seguinte), Bristol City e Norwich.

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Foto Premierleague.com

O Oldham havia tido sua única passagem pela elite entre 1910 e 1923, quando disputou sete temporadas seguidas, interrompidas apenas pela Primeira Guerra Mundial. Chegou a ser vice-campeão na temporada 1914-15, que antecedeu o conflito.

Desde então, descera até à quarta divisão por duas vezes, em 1958 e em 1969. Em julho de 1982, disputava a segundona quando surpreendeu ao demitir o escocês Jimmy Frizzell (no clube desde 1970) e apontar Joe Royle para o cargo.

Royle tinha apenas 33 anos e acabara de encerrar a carreira por motivo de lesão quando defendia o Norwich. Mas ele acabou vencendo a desconfiança inicial e permanecendo por vários anos no comando dos Latics.

GRANDES MOMENTOS NAS COPAS

Em meados de 1986, o clube aderiu a uma moda controversa no futebol britânico de então e adotou a grama sintética em seu estádio de Boundary Park.

Já na primeira temporada da novidade, em 1986-87, o Oldham ficou em terceiro na segunda divisão, mas acabou batido pelo Leeds na semifinal dos playoffs, desperdiçando uma boa chance de encerrar seu longo afastamento da elite.

Três anos depois, mesmo sem conseguir chegar aos playoffs, o clube viveu momento especial nas copas, chegando à semifinal da Copa da Inglaterra e à decisão da Copa da Liga – a primeira partida do clube no lendário palco de Wembley em sua história.

Foto: Colorsport

Na Copa da Inglaterra, o clube deixou para trás Birmingham, Brighton, Everton e Aston Villa, antes de cair diante do Manchester United, com um empate em 3 a 3 e uma derrota por 2 a 1, ambos os jogos disputados em Maine Road e com prorrogação.

Já na Copa da Liga, foi ainda mais brilhante: bateu o Leeds em dois jogos, amassou o Scarborough (7 a 0, com seis gols de Frankie Bunn – recorde para o clube) e eliminou Arsenal e Southampton antes de humilhar o West Ham com um 6 a 0 no jogo de ida das semifinais.

Na final, o time perdeu por 1 a 0 para o Nottingham Forest de Brian Clough em Wembley. Mas aquele misto de jogadores experientes com bons novatos mostrou que poderia dar trabalho.

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Eram muitos os destaques daquele time, a começar pela defesa, com a dupla sólida e ágil de zagueiros formada por Earl Barrett e Paul Warhurst e o bom lateral irlandês Denis Irwin, logo negociado com o Manchester United.

No meio, havia o ponteiro Neil Adams (ex-Everton) e o talentoso Mike Milligan, prata-da-casa, que seguiria para os Toffees. E na frente, a dupla goleadora: Frankie Bunn e o rodado Andy Ritchie (ex-Manchester United), além do veterano Roger Palmer, cria do Manchester City, na reserva.

Foto: Reprodução/Twitter

A temporada de 1990-91 foi a última com grama sintética (logo banida pela Football Association), mas também seria memorável por vir enfim o acesso à elite – e, de quebra, com a conquista do título da segunda divisão.

Para isso, o clube empreendeu uma virada épica ao vencer o Sheffield Wednesday por 3 a 2, com direito a gol de pênalti nos acréscimos, e ainda contou com uma derrota do West Ham, líder até então.

DE NOVO ENTRE OS GIGANTES

Para a primeira temporada na elite, o clube perdeu alguns jogadores importantes, cobiçados pelos grandes clubes: Warhurst saiu para o Sheffield Wednesday e, para seu lugar, veio o experiente Brian Kilcline, campeão da Copa da Inglaterra de 1987 com o Coventry.

Além disso, o clube bateu a porta do Everton e trouxe de volta Mike Milligan após um ano em Goodison Park, além do centroavante escocês Graeme Sharp, nome simbólico da geração vencedora dos Toffees de meados da década anterior.

Foto: Press Association Images

O objetivo de se manter na elite foi cumprido com relativa tranquilidade: o time terminou na 17ª posição entre 22 clubes, nove pontos acima da zona de rebaixamento. Mas o que chamou a atenção foi seu desempenho ofensivo.

Mostrando um futebol aberto, para frente, o Oldham marcou 63 gols em 42 jogos, ficando com o quarto melhor ataque do campeonato.

Jogando no Burnden Park, foram 46 gols em 21 jogos (mais de dois por partida). Apenas os Gunners em Highbury balançaram as redes mais vezes. Em casa também veio o resultado mais expressivo da campanha: vitória por 2 a 0 sobre o futuro campeão Leeds.

A GRANDE ESCAPADA

A ótima forma ofensiva continuou pela temporada seguinte, que marcou a edição inaugural da Premier League. O Oldham marcou de novo 63 gols, número igual ao do Queens Park Rangers e inferior apenas que os de Manchester United e Blackburn.

Foi ainda uma artilharia democrática: nada menos que 11 jogadores diferentes marcaram pelo menos três gols. O grande goleador, com 12 tentos, foi o recém-contratado atacante Ian Olney, vindo do Aston Villa ao fim da temporada anterior.

Foto: Premierleague.com

Mas o desempenho quase não evitou o retorno à segunda divisão. Embora ao longo da campanha registrasse vitórias esporádicas sobre Manchester United, Chelsea, Tottenham, Everton e uma goleada de 6 a 2 sobre o Wimbledon, chegara à reta final virtualmente condenado.

No início de maio, o Oldham ocupava a penúltima colocação, seis pontos atrás do primeiro time fora da zona de rebaixamento, o Sheffield United, embora tivesse um jogo a menos. Precisava vencer suas três partidas e torce por tropeços dos Blades ou do Crystal Palace.

O primeiro jogo destes três seria contra o Aston Villa, que disputava o título com o Manchester United. Precisava vencer no Villa Park para seguir com chances de levantar a taça. Era, portanto, um jogo de vida ou morte para ambos.

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Porém, o Oldham surpreendeu. Marcou com o meia Nick Henry no primeiro tempo e segurou o resultado de 1 a 0 que manteve suas chances de escapar da degola e ainda entregava de bandeja o título ao vizinho Manchester United.

Três dias depois, o time receberia o Liverpool. A essa altura, o Sheffeld United já havia vencido o Everton e praticamente se salvara. A briga seria com o Crystal Palace, que somou um ponto ao empatar fora com o Manchester City. Ao Oldham, só restava vencer.

E os Latics venceram. Abriram o placar com Darren Beckford, sofreram o empate com Ian Rush, mas Ian Olney marcou duas vezes ainda antes do intervalo. Nem mesmo o segundo gol de Ian Rush diminuiu a comemoração da torcida no Boundary Park.

No dia 8 de maio, menos de uma semana após o jogo com o Aston Villa, era a vez de enfrentar o Southampton, novamente em casa. O time abriu o placar com um gol olímpico do lateral Neil Pointon, mas sofreu o empate com Matt Le Tissier.

Sem se abalar, o Oldham desempatou ainda na etapa inicial com Ian Olney. E na segunda, chegou a abrir goleada, com Andy Ritchie e o lateral-direito norueguês Gunnar Halle marcando. Os Saints descontaram com dois gols de Le Tissier, e uma certa tensão tomou conta do estádio.

O alívio veio com o apito final e a notícia de que o Crystal Palace, que precisaria perder para o Arsenal em Highbury, havia caído por 3 a 0. Assim, as duas equipes terminaram com os mesmos 49 pontos, mas os Latics se salvaram por dois gols no saldo.

OUTRO GRANDE MOMENTO COPEIRO

Na temporada que seria sua última na Premier League e na elite inglesa, o Oldham fez mais uma campanha de destaque na Copa da Inglaterra e ficou outra vez muito perto de disputar sua primeira final do torneio. Mas o desfecho foi bastante semelhante ao de quatro anos antes.

O time estreou na terceira fase, superando o Derby County por 2 a 1. Na etapa seguinte, após empatar sem gols com o Stoke em casa, o time venceu o replay no campo adversário, iniciando uma série de vitórias por 1 a 0, batendo também o Barnsley e o Bolton.

Nas semifinais, como em 1990, o adversário seria o Manchester United – desta vez em momento mais forte, aproximando-se do bicampeonato da liga. Mas o Oldham quase surpreendeu os Red Devils no primeiro jogo, disputado em Wembley.

O placar em branco persistiu por todo o tempo normal e até o primeiro minuto da etapa final da prorrogação, quando Neil Pointon aproveitou rebote de Peter Schmeichel após um escanteio e colocou os Latics em vantagem, para o delírio de seus torcedores.

No último minuto da prorrogação, porém, com o United já partindo para o “abafa”, Mark Hughes se esticou para alcançar uma bola alçada e chutar de primeira para as redes, deixando a decisão da vaga para um replay dali a três dias em Maine Road.

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Desta vez, o Oldham nem teve chance. Denis Irwin e Andrei Kanchelskis marcaram em 15 minutos, Pointon descontou ainda na primeira etapa, mas no segundo tempo Bryan Robson e Ryan Giggs terminaram de selar a classificação dos Red Devils.

A nova frustração diante do mesmo carrasco de quatro anos antes acabaria interferindo na campanha dos Latics na Premier League, como veremos a seguir.

O FIM DA PASSAGEM PELA ELITE

Depois da escapada épica do descenso na temporada anterior, o começo da nova deixou claro que a equipe precisaria de outro milagre quando maio chegasse. Nos primeiros 12 jogos, somou apenas uma vitória e chegou a ser goleado pelo Tottenham por 5 a 0.

Só no fim de outubro o Oldham voltaria a vencer, batendo o Chelsea em Stamford Bridge por 1 a 0. Mas as derrotas continuariam: seriam nove nos próximos 12 jogos.

A partir de meados de janeiro, porém, o time ensaiou uma reação, enquanto a campanha da Copa da Inglaterra seguia em paralelo. Até o início de abril, o Oldham voltaria a bater o Chelsea, venceria o Southampton duas vezes, o Aston Villa fora de casa e golearia o Queens Park Rangers.

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Após esta última vitória, em 2 de abril, o Oldham era o 18º colocado, duas posições acima da zona da degola. Além disso, o time tinha dois jogos a menos em relação à maioria dos adversários contra o descenso. As perspectivas pareciam positivas.

Em seguida viriam três confrontos seguidos com o Manchester United, pela liga e os dois já citados pela semifinal da Copa da Inglaterra. Em Old Trafford, num jogo disputado, os Red Devils venceram por 3 a 2. E então vieram os dois que decretaram o fim do sonho dos Latics na copa.

A decepção foi sentida na liga. Depois da derrota em Old Trafford, o time perdeu os três jogos seguintes e não voltaria a vencer no campeonato. Na última rodada precisava vencer o Norwich em Carrow Road e ainda torcer por derrotas dos adversários.

O time saiu na frente com um gol de Sean McCarthy, mas o Norwich pressionou e conseguiu o empate com Robert Ullathorne. O resultado tirou qualquer possibilidade de sobrevivência do Oldham, encerrando sua última participação na primeira divisão inglesa.

Nos anos seguintes, o clube só desceu. Em 1997, caiu da First Division (atual Championship) para a Second Division (atual League One, terceira divisão). E após passar 20 anos nesta categoria, foi rebaixado para a League Two (quarta divisão) ao final da última temporada.

Emmanuel do Valle
Emmanuel do Valle

Jornalista de Niterói, formado pela Universidade Federal Fluminense e com passagens por Agência EFE, Jornal dos Sports, Lance! e TV Globo. Atualmente, também colaboro com o site Trivela, além de outros projetos. Pesquisador voraz da história do futebol nacional e internacional.