Quer ver a banda Oasis na sua volta para os palcos no ano que vem? Vai ter que pagar um preço tão salgado que o excesso do tempero é bem capaz de fazer mal para a saúde além do bolso.
Os ingressos são vendidos sob um regime conhecido como “dynamic pricing” (preço dinâmico, em português), uma expressão bem safada que quer dizer “incrivelmente caro quando se tem mais procura que oferta”. Então, pelos canais oficiais, um ingresso que no início custava 150 libras (R$ 1,1 mil, já muito caro) agora se vende por 350 libras (R$ 2,5 mil).
E, se cuida, torcedor – essa prática nefária já está indo para o futebol
O Valencia, na Espanha, já está implementando o tal “dynamic pricing”. Numa declaração com um grau de sem-vergonhice mais elevado que o preço dos ingressos, o clube argumenta que é tudo sobre “justiça”.
“Não seria justo”, segundo o clube, “alguém que planejou e comprou um ingresso adiantado pagar o mesmo preço de alguém que esperou até o último minuto”.
Tem uma pergunta óbvia. Por quê? O que isso tem a ver com justiça? Não vejo a menor ligação. Somente enxergo uma justificativa muito fraca para ganância sem freios.
Essa linha de mercado desregulada não tem cabimento no futebol — porque não se trata de um mercado, com atores competindo para clientes oferecendo serviços melhores. Futebol é cultura. O sujeito torce para o Valencia porque faz parte de uma identidade histórica.
Não se pode pensar como consumidor – “ah, o Valladolid tem uma promoção especial esta semana, então vamos virar torcedores de lá”.
O dono do clube, então, tem um mercado cativo. O torcedor do Valencia só vai torcer pelo Valencia, em qualquer circunstância. Dá para tratar ele como idiota e extrair o máximo possível do bolso dele.
Por isso os supostos donos nunca deveriam ser tratados como tal. Na verdade, não passam de guardiões de uma tradição que não fez nada para construir e devem agir assim — ou ser obrigados a agir assim — pela força de regulamentação.
Por enquanto, não se pode utilizar a política de “dynamic pricing” na Premier League. No início da temporada, os clubes têm que declarar os seus preços, que aí são fixos durante a campanha.
Donos estrangeiros (como no caso da Valencia) muitas vezes são bem menos sensíveis nesse assunto — vivem longe e enxergam o clube como um investimento. Para eles, pouco importa quem está dentro do estádio, desde que estejam arrecadando o máximo possível.
Há ainda o fair play financeiro na história
E tem um outro fator, que podemos colocar como exemplo da lei das consequências não previstas. Se chama Fair Play Financeiro (FPF), assunto de moda agora aqui no Brasil. O FPF bota limites na quantidade que um clube pode gastar — um limite flexível, calculado em cima do quanto o clube recebe.
Para gastar mais, tem que se arrecadar mais — o que deixa um incentivo óbvio para aumentar o preço dos ingressos e explorar mais ainda o tal do “mercado cativo”.
Sem essa praga de “dynamic pricing”, os ingressos na Inglaterra já são absurdos de caro. A experiência dos fãs de Oasis mostra que pode piorar muito mais.