O Arsenal precisa sofrer para ser relevante na Europa

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O Arsenal superou diversos fantasmas nessa terça-feira. Eram 14 anos sem chegar nas quartas de final da Champions League. Era uma sequência muito grande de eliminações em mata-mata de competições europeias. E era um time cheio de jovens que precisava provar que sabe lidar com momentos de pressão extrema.

Quis o destino que o herói da classificação fosse justamente o jogador mais questionado do time. Não porque David Raya faz uma temporada ruim, muito pelo contrário. Mas porque ele chegou agora e barrou Aaron Ramsdale, um dos grandes destaques da excelente campanha dos Gunners na última Premier League.

Se havia alguma dúvida sobre a polêmica escolha de Mikel Arteta pelo goleiro espanhol, não existe mais. E o clube que passou sete anos fora da Liga das Campeões já está entre os oito melhores do continente. 

Fazer sucesso na liga nacional é bem diferente de ser relevante em competições continentais. Frase batida, usadas muitas e muitas vezes, mas que continua sendo uma das maiores máximas do futebol.

E o Arsenal é uma grande prova disso

O time comandado por Arteta tem, nesse momento, o futebol mais bonito do campeonato mais difícil do mundo. Em 2024, venceu todos os oito jogos que disputou na Premier League. Marcou 33 gols, o que leva a uma incrível média de 4,1 por partida. Não à toa, é o líder da competição, com o melhor ataque e a defesa menos vazada.

Mas o Arsenal que vimos contra o Porto foi bem diferente. Principalmente na partida de ida. Derrota por um a zero, sem conseguir dar NENHUM chute no gol. No confronto de volta, uma apresentação melhor. Conseguiu pressionar o Porto em alguns momentos, principalmente na segunda etapa.

Mas visivelmente faltava aquela naturalidade que temos visto no campeonato inglês. Os movimentos, que a essa altura já parecem automáticos de tão bem treinados e ensaiados, não tiveram a mesma fluidez. E o jogador que mais exemplifica isso é Bukayo Saka. Talvez o maior destaque dos Gunners na temporada, o atacante inglês teve duas apresentações muito fracas, tanto em Porto quanto em Londres. Errando passes fáceis, não conseguindo ser um jogador perigoso no um contra um, o tempo todo preso na marcação. Não levou perigo em nenhum momento dos 210 minutos de confronto. 

Por que a dificuldade?

Pode-se encontrar diversas explicações para tamanha dificuldade. Uma bastante válida é a tradição, o estar acostumado a jogar competições europeias. Nessa terça, o confronto foi entre o Porto, que já conquistou a Champions League duas vezes e disputa a competição quase toda a temporada, e o Arsenal, clube que nunca levantou nenhuma taça europeia e voltou a Liga dos Campeões depois de sete anos.

Outra explicação válida é a pouca experiência de um grupo formado por jovens. Dos jogadores titulares nas duas partidas, apenas Jorginho e Kai Havertz tinham experiência de Champions League. 

O Arsenal foi eliminado exatamente nessa mesma fase nas últimas sete vezes que havia participado da competição: em todas as temporadas entre 2010/11 e 2016/17. Curiosamente, Mikel Arteta esteve presente, como jogador, em cinco dessas sete campanhas. E por falar no espanhol, o retrospecto dele como treinador em competições europeias também deixava MUITO a desejar.

Na temporada de estreia como técnico, o Arsenal foi eliminado pelo Olympiacos nas oitavas de final da Liga Europa. E foi da maneira mais traumatizante possível. Um gol de Youssef El-Arabi, no último minuto da prorrogação, garantiu o time grego na fase seguinte pelo critério de gols fora de casa.

Em 2020/21, o técnico espanhol teve a melhor campanha europeia até o momento. O time de Londres chegou à semifinal da Liga Europa. Acabou sendo eliminado pelo Villarreal, comandado por Unai Emery, ex-técnico do Arsenal. Na época, Arteta passou a ser comparado com o seu mestre, o gênio Pep Guardiola, mas por um motivo ruim: teria “inventado”, assim como Guardiola foi acusado de fazer em alguns fracassos do Manchester City na Champions League. Contra o Villarreal, Arteta chegou a escalar Granit Xhaka como lateral-esquerdo e Emile Smith Rowe como falso nove.

Depois de uma temporada sem competições continentais, os Gunners foram eliminados pelo Sporting nas oitavas de final da Liga Europa. Empate nas duas partidas, e o time português avançando na disputa de pênaltis. 

E então, a noite mágica desta terça-feira. Uma classificação suada, mas cheia de lições.

Não se aprende a chegar longe na Champions League sem sofrimento.

A verdade é que Arteta e Arsenal seguem crescendo juntos.  Na Premier League, já estão entre os melhores. Na Champions League, colocaram o clube em um lugar que há muito tempo não ocupava. A evolução do time comandado por Mikel Arteta é rápida. Bonita. E parece não ter limites.

Renato Senise
Renato Senise

Renato Senise é correspondente em Londres desde 2016. São mais de cinco temporadas cobrindo Premier League e Champions League. No currículo, duas Copas do Mundo “in loco”, além de entrevistas com nomes como Pep Guardiola, José Mourinho, Juergen Klopp, Marcelo Bielsa, Neymar, Kevin De Bruyne e Harry Kane.