Murillo, Danilo e mais… Por que tantos brasileiros estão reforçando o Nottingham Forest? Explicamos

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O Nottingham Forest teve só oito brasileiros ao longo da sua história de 159 anos. O primeiro deles chegou apenas em 2019. Outros sete passaram pelo clube a partir de julho de 2022 — mas por que tantos em tão pouco tempo?

A PL Brasil conversou com fontes próximas ao clube inglês para entender como é feito o trabalho de recrutamento e contratações que envolve o Brasil.

  • Como identificam talentos
  • O que é procurado no jogador brasileiro
  • Por que ir direto à fonte

O diferencial brasileiro do Nottingham Forest

Nomes como Danilo, Murillo e Gustavo Scarpa foram alguns dos que trocaram o Brasileirão pela Premier League de maneira direta, sem nunca terem atuado na Europa antes. Carlos Miguel, ex-goleiro do Corinthians, é o nome mais recente. Desde que voltou à Premier League, na temporada passada, o clube investiu pesado em reforços do mundo todo.

Murillo, ex-Corinthians, no Nottingham Forest (Foto: IMAGO/Pro Sports Images)

O Nottingham Forest conta com um profissional que representa o clube no Brasil para tratar de recrutamento, observação e até parte das negociações com jogadores do país. É alguém que mora aqui e visita os estádios para acompanhar jovens in loco.

Mas a diferença não para por aí: a abordagem também é distinta. Outras equipes que contam com profissionais no Brasil, como as do Big 6, têm um trabalho de observar, fazem relatórios e avisar a direção sobre os craques em potencial por aqui pensando a longo prazo.

Só que a ideia desses clubes, muitas vezes, é fazer uma segunda ou terceira transferência de um jogador apenas futuramente, quando ele já estiver na Europa.

O Forest se mostra diferente ao abordar o jogador já no Brasileirão para uma transferência direta — o que tem acontecido com mais frequência com outros clubes, a exemplo dos jovens que têm ido ao Chelsea.

E a perspectiva é de crescimento: a reportagem apurou que, para 2025, a ideia é que cerca de dois outros profissionais sejam contratados para formar uma equipe no Brasil.

Esse crescimento não se dá só por priorizar o nosso país, mas para ajudar na cobertura de toda a América Latina.

Danilo em jogo do Nottingham Forest
Danilo em jogo do Nottingham Forest. Foto: Icon Sport

O Brasil é “exclusivo”?

O profissional do clube que trabalha no país, por outro lado, não cobre apenas o Brasileirão. Sua observação também é estendida a praticamente toda a América Latina. Mas com as devidas prioridades.

“O mercado mais importante é o brasileiro, sem dúvidas. Depois Argentina, Uruguai, Colômbia… Mas primeiro o Brasil”, disse a fonte à PL Brasil.

Isso porque a percepção é de que o Brasil ainda produz talentos melhores, em média, do que seus vizinhos de continente. A PL Brasil ouviu como os brasileiros são bem vistos pela inerente habilidade e a capacidade de improviso.

— Eles (jogadores brasileiros) ainda são diferentes no trato com a bola. E se o jogador talentoso não consegue jogar lá fora, é mais problema do treinador do que do jogador.

Como o Nottingham Forest contrata um jogador brasileiro

O processo começa nos estádios. In loco, jogadores de interesse são acompanhados e analisados em seu comportamento individual e coletivo. São muitos relatórios e conversas formais e informais até uma proposta.

🔎O profissional ouvido pela reportagem revela que não faz muitas anotações durante os jogos que assiste. Gosta de analisar mais os comportamentos dos jogadores que está observando e prefere ter uma visão mais coletiva do que simplesmente acompanhar um atleta individualmente sem perdê-lo de vista.

Em outra reportagem especial, a PL Brasil havia acompanhado o trabalho de diferentes scouts da Premier League e dissecou seus métodos de trabalho para observar e contratar jogadores do Brasileirão.

— Eu gosto de ver como o jogador se comporta em relação ao que ele faz e ao coletivo. Como ele reage se o companheiro perde a bola? Quando outro jogador comete um erro? E se ele mesmo tomar amarelo? Isso é muito importante — revelou.

📝Esse profissional faz seus próprios relatórios depois da partida — um procedimento padrão em qualquer clube. O documento conta com informações básicas do jogador: nome, posição, pé dominante, características, destaques e defeitos com e sem a bola.

Características psicológicas, físicas e morfológicas também são descritas. No caso das promessas, se o jovem tiver certo biotipo que o clube entende que vai se desenvolver no futuro, a análise deixa de lado o peso dado à força.

O importante para as promessas, nos olhos destes profissionais, é o aspecto futebolístico. Sua técnica, criatividade e capacidade de sair de constrangimentos sem instrução prévia são os maiores pontos de observação.

Observou, gostou… e agora?

🎯 Uma vez que o jogador é identificado como um encaixe positivo para o clube, esse nome é indicado para os colegas do profissional na Inglaterra. Seus relatórios são compartilhados com companheiros no Nottingham Forest, e eles também fazem seus próprios relatórios.

🤝 Todos entraram em consenso? O jogador é de interesse do clube. Agora, o trabalho volta para o profissional do Brasil e ele toma as rédeas para fazer o primeiro contato com atleta e empresário.

💬 A partir daí, há uma conversa com o jogador em que é revelado o interesse do Nottingham Forest em contratá-lo. Fala-se sobre o projeto, em estágios iniciais, com o empresário. Esse é um procedimento bastante inicial, mas comum: jogadores recebem esse tipo de contato com alguma frequência.

🔛 Se atleta e agente derem o sinal de positivo, no sentido de que também estão interessados em uma transferência, é iniciada a próxima fase. Agora, o profissional no Brasil reporta à direção do Nottingham Forest para dar início à negociação.

scarpa forest
Scarpa pelo Nottingham Forest (Foto: Foto: Icon Sport)

💱 No caso do Nottingham Forest, a PL Brasil ouviu que é geralmente o presidente Tom Cartledge quem faz as negociações. Além dele, membros da diretoria e até o proprietário, Evangelos Marinakis, podem participar.

No entanto, isso é apenas o começo da negociação, e nada está definido. E a reportagem foi informada de que muitos jogadores ficam deslumbrados ao ouvirem sobre o interesse do clube e interpretam mal — acham que já serão contratados. Isso pode gerar desconforto com o clube atual e, no fim, acabar minando o negócio.

E por que escolher o Forest?

Clubes do Big 6 tendem a crescer mais os olhos dos jovens atletas quando miram uma transferência à Premier League. Ainda assim, o Forest, entendendo da sua posição no mercado, tem um trunfo.

A ideia do clube é, principalmente, oferecer uma porta de entrada ao Campeonato Inglês, o mais desejado do mundo, para as jovens estrelas. Em vez de irem, por exemplo, primeiro para Serie A ou LaLiga e depois fazer o caminho até a Inglaterra, a equipe de Nottingham é uma forma de já ingressar de vez na Premier League.

O plano mostrado aos jogadores é que começar a carreira na Europa na liga inglesa pode ser mais proveitoso para o desenvolvimento do atleta. Dessa forma, ele já se acostuma com o ritmo do jogo, o país e a língua. Mas o clube também é beneficiado.

O foco do Forest ao contratar jovens estrelas é também revender esses jogadores e lucrar. O clube pensa na questão financeira a médio e longo prazo enquanto, por ora, não pode oferecer ao jogador a briga por títulos.

Ao passo que é mais fácil e comum um jogador que já está na Premier League ser contratado por um gigante do Big 6, as cifras também tendem a ser maiores — o que gera mais lucro ao time de Nottingham.

As burocracias para contratar um brasileiro

Se as últimas temporadas têm sido de recorde de brasileiros na Premier League, muito se deve por questões burocráticas. A entrada dos nossos jogadores na Inglaterra foi facilitada por conta do Brexit.

Esse foi o nome dado ao movimento de saída do Reino Unido da União Europeia (British exit, em inglês), iniciado em 2016 e formalizado em 2020. As regras para clubes da União Europeia limitavam a entrada de estrangeiros.

Murilllo Danilo Nottingham Forest
Murilllo (ex-Corinthians), Danilo (ex-Palmeiras) e Moussa Niakhate pelo Nottingham Forest (Foto: Icon Sport)

Antes, era necessário um passaporte europeu ou visto de trabalho. E se limitava basicamente a jogadores de seleção. O sistema de pontos demorava anos para liberar os jogadores do Brasileirão — explica o profissional.

O que é e como funciona o sistema de pontos para estrangeiros

O visto de trabalho é dado para os jogadores que atingem uma pontuação específica imposta pela Federação Inglesa. Os pontos são definidos por diferentes critérios e analisados dentro de uma linha temporal dos 12 meses anteriores à chegada do jogador ao país.

Os critérios:

  • Número de jogos pela seleção de seu país;
  • Número de minutos jogados em competições nacionais;
  • Número de minutos jogados em competições internacionais;
  • Posição do time do jogador em sua liga nacional;
  • Até onde o time do jogador avançou em competições internacionais;
  • Em qual nível está a liga do time do jogador.

O último critério é definido em seis níveis. O primeiro é composto pelas cinco principais ligas europeias (os campeonatos inglês, espanhol, italiano, alemão e francês). O segundo tem ligas de Portugal, Holanda, Turquia e Bélgica, enquanto o Brasil aparece somente no terceiro nível — ou seja, pontua menos.

Mas caso os jogadores não atinjam essa pontuação inicialmente, há outra saída: os wildcards. Eles são quatro espaços no elenco que podem ser preenchidos por jogadores que não têm pontos necessários para serem contratados.

A PL Brasil ouviu que Murillo, ao sair do Corinthians, não tinha a pontuação necessária para ter seu visto de trabalho. O Nottingham Forest então usou um wildcard com o zagueiro brasileiro e ele pôde ser inscrito.

Agora, Murillo já atingiu os pontos e, para a próxima temporada, será registrado normalmente. Isso vai liberar um espaço para o clube contratar outro jogador nestas condições.

Os próximos passos do Nottingham Forest no mercado

Carlos Miguel é o novo brasileiro a chegar no clube inglês. Outros rumores recentes que envolveram atletas brasileiros, no entanto, foram desmentidos. Foi o exemplo do jovem Riquelme, do Palmeiras. Houve a garantia, no entanto, de que muitos brasileiros — incluindo nomes ligados ao clube — têm sido observados.

Carlos Miguel Corinthians futebol inglês
Carlos Miguel pelo Corinthians (Foto: Imago)

No fim das contas, o mercado do Nottingham Forest deve ser mais uma vez agitado. Em meio a entradas e saídas, uma garantia da fonte:

“Vamos contratar uma promessa nessa janela”, assegurou.

Guilherme Ramos
Guilherme Ramos

Jornalista pela UNESP. Escrevi um livro sobre tática no futebol e sou repórter da PL Brasil. Já passei por Total Football Analysis, Esporte News Mundo, Jumper Brasil e TechTudo.

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