Já escrevi algumas colunas sobre o Manchester United. O tom geralmente era crítico ou pessimista porque esse é praticamente o status do clube desde a saída de Sir Alex Ferguson em 2013. Chegou um momento em que até vender ilusão no início da temporada ficou difícil.
Mas dessa vez acredito que, com Rúben Amorim, o torcedor enfim tem elementos para se animar.
Reparem que eu escolhi cuidadosamente a palavra. Não é se empolgar, pois há muito a ser feito – essa talvez seja a próxima fase se tudo der certo até lá. Animar-se, neste caso, significa abraçar uma mudança de espírito.
Rúben Amorim foi esse cara para o Sporting. Os Leões pagaram 10 milhões de euros para tirá-lo do Braga em 2020, num movimento apontado como uma loucura, afinal, ele tinha somente três meses de experiência na elite do futebol português. E 35 anos de idade.
Ele havia assumido o Braga em dezembro de 2019 no lugar de Ricardo Sá Pinto e conseguiu 10 vitórias em 13 jogos, conquistando a Taça da Liga e derrotando Benfica, Porto e Sporting um par de vezes.
O Sporting era um gigante adormecido. Somava 18 títulos, mas não era campeão desde a temporada 2001/02 — na época, o Benfica tinha 30 canecos, e o Porto, 18. Quando assumiu, a conta estava em 37 e 29.
Rúben Amorim tratou de acabar com o duopólio logo na sua primeira temporada completa, dando fim a uma seca de 19 anos. O clube apostou na sua capacidade de montar equipes, mas sobretudo na sua faceta competitiva, que herdou dos tempos de jogador (um meio-campista de relativo sucesso que fez parte do elenco de Portugal na Copa de 2010).
Rúben tem uma personalidade forte, mas sabe lidar com a imprensa como poucos por ter enorme clareza em seu raciocínio. É, também, carismático. Aconselho vocês a ouvirem suas entrevistas.
Outro grande feito foi saber desenvolver jovens talentos, aproveitando as divisões de base do Sporting, mas também descobrindo outros atletas que renderam esportiva e financeiramente ao clube.
Estão nesta lista: Mateus Fernandes (começando a se destacar no Southampton), Manuel Ugarte (que reencontrará no Manchester United), Pedro Porro (Tottenham), Matheus Nunes (Manchester City), Nuno Mendes (Paris Saint-Germain) e João Palhinha (Bayern após anos de sucesso no Fulham). Entre outros.
Na temporada passada, conquistou pela segunda vez o Campeonato Português, e com 10 pontos de vantagem sobre o Benfica, o seu time de coração. Até aqui, deixa o time também na liderança na temporada atual.
Esse basicamente é o seu currículo.
Mas por que eu acho que vai dar certo?
Porque Rúben Amorim mostrou ser um especialista em fazer mais com menos.
Ele transformou o Sporting numa força nacional (esqueci de citar as duas Copas da Liga que venceu) e que ainda foi capaz de viver algumas grandes noites europeias, como quando eliminou o Arsenal na Liga Europa 2022/23, ou na última quarta-feira, quando aplicou 4 a 1 sobre o Manchester City na Liga dos Campeões — num ensaio dos embates que podem vir contra Pep Guardiola.
É claro que não estamos falando de um trabalho de uma ou duas temporadas. Para o Manchester United competir de fato pelo título eu diria que precisará de pelo menos duas grandes janelas de verão com um grande aproveitamento em chegadas e saídas.
Hoje o Manchester United pode ser definido como um time medíocre com resultados medíocres (torcedores, não estou falando do clube, e sim do time!). Todos os gastos excessivos das últimas temporadas resultaram num elenco desequilibrado, com poucos nomes confiáveis para o futuro. E muitos supervalorizados.
Mas essa percepção pode começar a mudar no campo
Nas métricas de desempenho até o início desta rodada, o Manchester United era o 14º em xG contra (gols esperados) — ou seja, o 7º time que mais concedeu chances aos adversários. E apenas o 18º em gols marcados (9!). É um time que custa a encurralar seus adversários no campo de defesa, mas tampouco é letal no contra-ataque para justificar uma postura menos corajosa.
Rúben Amorim pode melhorar isso com a mudança de esquema prevista para o 3-4-3 (já que foi praticamente o único sistema utilizado no Sporting). Em breve poderá contar com Leny Yoro na zaga, e muitos apostam que Hojlund terá papel semelhante ao do sueco Gyokeres, fenômeno de gols no Sporting de Amorim.
Casemiro pode ser um terceiro zagueiro? Ugarte fará dupla com Mainoo na volância? Quais serão os alas, geralmente fundamentais no seu jogo? E os pontas/atacantes? Teremos Rashford e Garnacho por dentro, como Pedro Pote?
Há muita margem para melhora.