É impossível falar de futebol em inglês sob um ponto de vista histórico e não falar do Leeds United. O clube de Yorkshire marcou época e já significou sinônimo de excelência dentro da Inglaterra. Glórias, vitórias, títulos, tudo começou através da metodologia de um homem: Don Revie.
Como tudo na vida, nada em Leeds aconteceu por acaso. Bem, talvez a trajetória que levou Revie até o comando dos Whites contou sim com um pouco de sorte. Primeiro é preciso relembrar a situação do tradicional clube inglês na época que tudo começou.
Estamos no final dos anos 1950, Revie ainda era um respeitado atacante que atuava pelo Sunderland até ser vendido para o Leeds. Em crise técnica e financeira, a equipe de Yorkshire lutava para fugir de mais um rebaixamento. Completamente desesperada, a diretoria resolveu apostar no experiente jogador, à época com 33 anos, para assumir o clube. Deu certo.
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Logo de cara, o jovem treinador conseguiu livrar seu time de um novo descenso. Dali para frente, o Leeds sofreu uma reformulação completa: da cor dos uniformes até a maneira de socializar dos jogadores. Era a chegada do profissionalismo.
O motivo para a troca de cor da camisa, inclusive, virou uma espécie de piada local. Revie queria que o Leeds trocasse o azul royal pelo branco. A inspiração? O Real Madrid, pentacampeão da Liga dos Campeões nos anos 1950.
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Essa era o tipo de mentalidade vencedora que o ainda inexperiente comandante queria utilizar como fundação para a sua nova equipe.
Don Revie é considerado por muitos um visionário e responsável por uma verdadeira mudança de cultura dentro do futebol inglês. O treinador direcionava energia para alguns setores completamente esquecidos por outros clubes, como o departamento de nutrição, psicologia e até mesmo relações públicas.
No início, tudo era tocado pelo próprio técnico. Mesmo rígido e sem permitir atletas descompromissados, Revie era visto como um verdadeiro pai pelo grupo. O “chefe”, como preferia ser chamado, gostava, por exemplo, de conhecer as famílias de seus jogadores, além de também servir como confidente.

O espírito de camaradagem foi um dos pilares para as conquistas do Leeds. Bingos, noites do boliche, eram artifícios usados pelo técnico para aproximar ainda mais seus comandados.
Com o tempo, todo o amparo extracampo foi se mostrando em resultados dentro dos gramados. Preparados psicologicamente, fisicamente e tecnicamente, os Whites começaram a vencer. E pegaram jeito pela coisa.
Contando com peças como Billy Bremner, Jack Charlton, Allan Clarke, Norman Hunter e Johnny Giles, logo o Leeds passou a ser respeitado em todo território inglês. Não só temido, como também odiado.
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Para se ter uma noção da importância de Revie, foi o treinador quem convenceu Bremner, posteriormente seu capitão, a permanecer em Leeds. O escocês sentia saudade de casa e queria ser transferido. Johnny Giles, por exemplo, era do Manchester United e foi persuadido a trocar os Red Devils por um time à época de segunda divisão.
O clube de Yorkshire era acusado de fazer tudo para vencer, inclusive bater (bastante), sendo assim uma equipe suja. Daí surgiu o termo “Dirty Leeds”, cunhado até hoje. Um dos maiores críticos dos Whites era também um de seus maiores rivais: Brian Clough.
Logo se desenvolveu uma rivalidade envolvendo o lendário técnico do Nottingham Forest e Revie. O filme “The Damned United” (Maldito Futebol Clube) conta com detalhes todo o período.
A dupla também protagonizou uma das maiores entrevistas da história do futebol inglês em 1974, logo após Clough ser demitido do Leeds que tanto criticava. Um verdadeiro marco.
Apesar de parte da torcida curtir a fama de durão de seu time, a pecha de desleal incomodava o “Chefe”, que sempre negou qualquer incentivo para que seus atletas fossem maldosos. Em entrevistas, mesmo após as aposentadorias, os jogadores também afirmavam que somente eram firmes e revidavam as provocações de campo.
Coincidentemente (ou não), a decadência tanto social quanto técnica da dupla Leeds-Revie começou lado a lado. Visando novos desafios após se tornar multicampeão em seu clube, o treinador assumiu a Inglaterra, enquanto os Whites caminharam rumo ao desconhecido futuro sem seu comandante e construtor pelos últimos 13 anos.
A passagem de Don Revie pela seleção não foi nada positiva. Pressionado, ele pediu demissão e assumiu um cargo no Oriente Médio. A decisão, por escolha do técnico e mediante pagamento, saiu primeiro na imprensa do que na própria Federação Inglesa. Pegou mal.
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Com fama de mercenário, Revie nunca mais foi visto pela opinião pública da mesma forma. O ódio dos tempos de Leeds aliado a imagem de alguém ganancioso só piorou com a denúncia de um esquema de propinas. A carreira do lendário treinador nunca se recuperou de tamanho baque.
O seu amado clube também jamais voltou a ser o que era. Viveu de pequenos feitos na década de 1990, mas sofreu com más gestões e hoje briga para voltar à Premier League. Muito pouco para alguém que já foi referência no país.
Mesmo julgado e condenado por muitos, Don Revie jamais sairá do coração de quem sempre o amou de forma incondicional: o povo de Yorkshire. Por lá, não existe polêmica que cause qualquer dano a imagem do eterno comandante.
Naquelas bandas, ele é e sempre será o maior de todos.