Júlio Baptista e sua noite épica no Arsenal, de 4 gols em Anfield

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Júlio César Pereira Baptista, ou só Júlio Baptista, tem uma trajetória bastante vitoriosa no futebol. Pela seleção brasileira, quase 50 partidas (tendo disputado a Copa do Mundo de 2010) e quatro títulos: duas vezes campeão da Copa América e também bicampeão da Copa das Confederações. Na carreira de clubes, igualmente bem sucedido, do promissor início no São Paulo às duas conquistas do Campeonato Brasileiro pelo Cruzeiro.

Nesse percurso, apesar das lesões, traçou uma caminhada de sucesso pelo futebol europeu. Na Espanha, autor de 50 gols em 84 partidas pelo Sevilla, peça fundamental do Málaga que chegou às quartas de final da Champions League e campeão nacional pelo Real Madrid. Já na Itália, chegou bem à Roma, ainda que sem o mesmo brilho. E é assim, em síntese, que muitos se lembram da passagem de Júlio Baptista pela Europa.

Contudo, no meio dessa jornada, há ainda um outro capítulo, que, embora por vezes ofuscado, contém memoráveis lampejos de protagonismo. Na temporada 2006/2007, o brasileiro esteve emprestado ao Arsenal. No elenco estrelado de Arsène Wenger, ele quase sempre foi reserva, mas, mesmo assim, chegou a 35 jogos e 10 gols. Desses, seis pela Copa da Liga, dos quais quatro na mesma partida, numa noite épica em Anfield.

Liverpool x Arsenal, Copa da Liga, 09/01/2007

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PAUL ELLIS/AFP via Getty Images

Nos últimos anos, Arsenal e Liverpool frequentemente protagonizam partidas bastante movimentadas, de muitos gols para ambos os lados. Na Copa da Liga 2019/2020, por exemplo, chamou a atenção um maluco 5×5. Uma década antes, em 2009, o histórico 4×4, na lendária noite de Andrey Arshavin, autor de um poker em Anfield.

Contudo, sem tirar os méritos do mago russo, muitos se esquecem que menos de dois anos antes Júlio Baptista protagonizara exatamente o mesmo feito: quatro gols pelos Gunners em cima do Liverpool, em Anfield. Só que não na Premier League, e sim pela Copa da Liga. Mas, no longínquo 2009, qual era o contexto do jogo?

Entre as rodadas de Boxing Day e de Ano Novo, o Arsenal vencera Watford e Charlton, mas fora derrotado pelo Sheffield United, perdendo uma invencibilidade de seis jogos e parando na 5ª posição da Premier League. Já o Liverpool, que vira sequência de quatro vitórias ser interrompida por derrota para o Blackburn, conseguiu vencer Tottenham e Bolton, retornando à 3ª colocação da liga.

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Em meio a essa maratona de jogos na elite do futebol inglês, as equipes também já vislumbravam as oitavas de final da Champions League, dali a pouco mais de um mês. O Arsenal, então vice-campeão, enfrentaria o PSV, enquanto o Liverpool, vencedor dois anos antes, encararia o Barcelona.

Por isso, Wenger e Rafa Benítez escalaram times mistos na partida de início de janeiro, válida pela Copa da… Inglaterra. Ué, Copa da Inglaterra? Sim, porque, três dias antes do confronto pela Copa da Liga, Arsenal e Liverpool se enfrentaram pela 3ª rodada eliminatória da Copa da Inglaterra. Na ocasião, 3 a 1 para os Gunners, gols de Rosicky (2x), Thierry Henry e Dirk Kuyt.

O jogo seguinte, aí sim pela Copa da Liga, com escalações praticamente reservas das duas equipes. O Liverpool foi a campo com Dudek; Lee Peltier, Hyypia, Paletta, Warnock; Fábio Aurélio, Guthrie, Gerrard; Bellamy, Mark González, Robbie Fowler. Já o Arsenal, com Almunia; Hoyte, Kolo Touré, Djourou, Aramand Traoré; Alex Song, Denílson, Cesc Fàbregas; Aliadière, Theo Walcott, Júlio Baptista.

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Antes do apito inicial da partida de 9 de janeiro de 2007, Júlio Baptista, já há seis meses em Londres, tinha, apenas duas partidas como titular dos Gunners, além de 10 jogos saindo do banco de reservas, incluso aquele de dias antes contra os Reds. Nessas 12 aparições, um único gol marcado, nos minutos finais de vitória sobre o Hamburgo na fase de grupos da Champions League.

Noite épica e 4 gols de Júlio Baptista 

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Laurence Griffiths/Getty Images

Naquela noite fria de início de janeiro, os mais de 42 mil presentes em Anfield demoraram um pouco para perceber que algo grandioso lhes aguardava. Isso porque o acontecimento mais significativo dos minutos iniciais fora a entrada de Luis Garcia no lugar de Mark González, lesionado.

Mas aquele jogo morno estava prestes a sofrer uma enorme reviravolta, transformando-se em uma das partidas mais interessantes da temporada. Ao intervalo, o placar já apontaria 4 a 1 para os visitantes. O primeiro gol do confronto saiu aos 27 minutos, quando os Gunners inauguraram o marcador com Aliadière.

O Liverpool empatou logo em seguida, aos 33 minutos, pelos pés de Robbie Fowler, depois de Almunia rebater cobrança de falta de Fábio Aurélio. Foi aí, então, que teve início a grande noite de Júlio Baptista – de número 9 nas costas. Aos 40 minutos, cobrou falta de longe, no canto inferior de Dudek, sem chances para o goleiro.

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Já nos acréscimos do primeiro tempo, após escanteio cobrado por Fàbregas, a bola passou pelo brasileiro, mas não por um jovem Alex Song, que, em toque com o braço, marcou o terceiro gol do Arsenal. Imediatamente na sequência, Júlio Baptista fez linda jogada e tabelou com Aliadière, que o deixou livre para ampliar a vantagem dos Gunners.

Na segunda etapa, a equipe londrina continuou pressionando e, aos 13 minutos, Hyypia cometeu pênalti em Aliadière. Com moral no clássico, Júlio Baptista cobrou a penalidade, mas parou nas mãos de Dudek, que fez grande defesa. Porém, o atacante teve a chance de se redimir dois minutos depois e, de fora da área, acertou belo chute rasteiro, que por pouco não beliscou a trave. Terceiro gol de “Baptista” e 5 a 1 Arsenal.

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Alex Livesey/Getty Images

Assim, com o placar se tornando elástico, Benítez lançou mão de dois de seus principais jogadores, Xabi Alonso e Jamie Carragher, sacando Warnock e Luís Garcia. As substituições do espanhol surtiram efeito e a equipe mandante alcançou dois gols, aos 23 e aos 35 minutos.

No primeiro deles, um voleio impressionante de Gerrard, logo antes do capitão quase marcar um lindo gol de falta. Já no segundo, Hyypia recebeu cruzamento certeiro e fez de cabeça, dando grandes esperanças aos Reds, a pouco mais de 10 minutos para o fim da etapa complementar.

Contudo, essa esperança logo se esvaiu, quando Júlio Baptista anotou o sexto gol do Arsenal, e o seu quarto na partida, marcando para sempre seu nome na história do confronto. Após mais um grande lance de Aliadière (sempre ele), o brasileiro recebeu passe açucarado do francês e, debaixo do gol, estufou as redes, para a vibração de Arsène Wenger.

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Com a atuação de gala, Júlio Baptista conquistou mesmo o treinador, que o teria contratado em definitivo não fossem os altos valores pedidos pelo Real Madrid. Assim, o jogador foi utilizado em 20 das 25 partidas restantes do clube na temporada. Dessas, 15 como titular, incluindo o jogo decisivo contra o PSV pela Champions League e a final da Copa da Liga, contra o Chelsea.

Nesse ínterim, o versátil brasileiro teria alguns outros momentos de destaque pelo Arsenal, como os gols contra Manchester City, Fulham e Reading na Premier League, e os dois contra o Tottenham na semifinal da própria Copa Liga. Mas nenhum deles comparável ao brilho na inesquecível noite de 9 de janeiro de 2007, o ponto mais reluzente de sua breve jornada na Inglaterra.

Rafael Moro Brandão
Rafael Moro Brandão

Estudante de Direito na Universidade de São Paulo. Fanático por futebol e apaixonado pelas histórias que o esporte proporciona.