O que explica a chegada da Inglaterra na final da Euro – e como sair dela com a taça

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Como a mesma seleção inglesa que foi tão chata jogo atrás de jogo desde o início da Eurocopa foi capaz de produzir aquele primeiro tempo contra a Holanda?

Levou um golaço cedo e reagiu com ondas de ataques que provocaram pânico na defesa adversária. Poderia tranquilamente ter marcado três ou quatro gols antes do intervalo. E foi o mesmo time, mesmos jogadores, mesmo sistema que ficou a segundos de ser eliminado, com toda justiça, somente onze dias antes contra a Eslováquia.

Futebol e as suas variáveis. Acredito que, desta vez, a variável chave não foi nem técnica nem tática — foi emocional. A sensação dominante nos jogos anteriores foi de medo. A derrota para a Islândia num amistoso antes do torneio minou a confiança do time na sua capacidade de fazer um jogo expansivo. 

Aí entrou cauteloso e congelado, cheio de passes seguros para trás ou para o lado, ninguém disposto a arriscar. Desta maneira, acabou quase trazendo o vexame que tanto estava tentando evitar. 

Chegando nas semifinais, porém, não tem mais vexame, nem vergonha ou tragédia. Tem um peso pesado no outro lado do campo e uma possibilidade de glória. Liberou o time.

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A seleção inglesa na disputa da Eurocopa. Foto: Icon Sport

Claro, como sempre falam os jornalistas de boxe, os estilos que fazem a luta. E o estilo da Holanda abriu a porta para os homens de Gareth Southgate. O sistema meio estranho da Holanda — mistura de linha de três e linha de quatro — deixou muito espaço na frente do lateral direito. Perfeito, então, para Bukayo Saka. Bola para ele, problemas para Holanda. 

O adversário da Inglaterra passou o primeiro tempo perplexo, tentando equilibrar o jogo com a reação comum de um time sendo superado — trazer mais jogadores por trás da linha da bola e rezar. No intervalo, o técnico Ronald Koeman conseguiu organizar o time, adiantado as linhas e dificultando as jogadas inglesas. 

O encontro equilibrado foi decidido num lance de talento — Ollie Watkins oferece a chance de esticar o jogo, correndo por trás da linha da defesa. O Harry Kane de 2024, muito parado, não ia marcar o gol de Watkins que garantiu a classificação para a final.

A primeira final, incrivelmente, na sua história que a Inglaterra vai jogar fora de casa.

Tem chances?

Claro que a Espanha é a favorita. Na verdade, qualquer resultado a não ser uma vitória espanhola seria uma injustiça no contexto do torneio. Mas, como fala a turma de boxe, os estilos que fazem a luta. Será que o futebol proativo da Espanha é capaz de favorecer a Inglaterra?

Bem, para jogar efetivamente no contra-ataque tem que ter peças para tal. Harry Kane cabe nesta abordagem? Duvidoso. Mas Harry Kane no banco? Mais duvidoso ainda. Ollie Watkins vai ter que esperar um pouco.

Um grande problema é tirar a bola da Espanha. Rodri é o centro de tudo. 

A França tentou uma resposta, com N’Golo Kante operando como uma sombra de Rodri. Não adiantou. A França perdeu os serviços de um grande jogador em outras partes do campo, enquanto a Espanha achou outras maneiras para avançar a bola.

O time tem uma circulação da bola excelente, ampliando o campo com os seus pontas e laterais, trocando de posições no último terço e usando talento coletivo e individual para confundir a marcação.

O que sobra para a Inglaterra? Resiliência e lampejos do futebol. Jogadores capazes de sair do banco e mudar o jogo. Um dia inspirado de Saka, Jude Bellingham ou Phil Foden.

Pensando em disputar um título com a Espanha, Foden tem motivos para sorrir. Sete anos atrás ele, junto com Marc Guehi e Connor Gallagher, fez parte da seleção inglesa que conquistou o Mundial sub-17. Espanha na final. Placar 5 a 2. Três gols de Foden. Contra um grande adversário, parece que a Inglaterra vai precisar de uma atuação tão boa de um dos seus craques para levar o troféu.

Pelo menos não precisa ter medo de vexame. A seleção inglesa que classificou para a sua primeira final fora de casa já fez história.

Tim Vickery
Tim Vickery

Tim Vickery cobre futebol sul-americano para a BBC e para a revista World Soccer desde 1997, além de escrever para ESPN e aparecer semanalmente no programa Redação SporTV. Foi declarado Mestre de Jornalismo pela Comunique-se e, de vez em quando, fica olhando para o prêmio na tentativa de esquecer os últimos anos de Tottenham Hotspur.