Nove de abril de 2005. O Manchester United era uma das grandes equipes do futebol mundial. Com Cristiano Ronaldo, Wayne Rooney e van Nistelrooy, o time comandado por Sir Alex Ferguson enfrentava o Norwich City no modesto estádio Carrow Road pela Premier League.
Com cada vez mais atenção e admiração, trazendo mais seguidores e torcedores fora da Inglaterra, os Red Devils eram, para muitos, o grande motivo para assistirem ao jogo do Campeonato Inglês.
No Brasil, o pequeno Lucas ligou a sua televisão, começou a passar pela grade de programação dos canais e decidiu assistir ao jogo fora de casa do Manchester United, que buscava o nono título da Premier League em 15 temporadas da competição.
Entre tantas estrelas no elenco de Ferguson, a primeira coisa que lhe chamou a atenção foi o símbolo do Norwich City. Era um canário, igual ao que Lucas La Torre tinha recebido de presente de seu avô, que resgatava pássaros mal-tratados que não conseguiam retornar à natureza.
Ainda sem conhecer nada sobre o clube amarelo da Inglaterra, Lucas passou a torcer pelos “canarinhos”. Com os olhos vidrados em sua televisão, o brasileiro, pôde comemorar, mesmo de longe, o gol marcado por Dean Ashton. A atmosfera do Carrow Road, que tremeu com mais de 25 mil torcedores comemorando a vitória do time, espantou a ainda criança, que já notava o crescimento de algo especial com o Norwich City.
“Os gols fizeram a torcida comemorar como eu nunca tinha visto antes. Bem no estilo inglês. Alguns até pularam as placas de publicidade para abraçar os jogadores e eu achei aquilo fantástico. E quando o fim do jogo aconteceu, me fez sentir que havia algo em especial com o clube, que eu mal tinha aprendido o nome naquele momento.”
A curiosidade de jovem e o amor crescente pelo Norwich
O tempo passou, mas a admiração pela torcida e pelos “canarinhos” causaram curiosidade em Lucas. Mais amadurecido e conhecendo mais sobre futebol, o agora jovem, em 2009, descobriu a importância daquela vitória em Carrow Road para a temporada do Norwich City.
A vitória contra o poderoso Manchester United dava esperanças para os Canários na fuga contra o rebaixamento naquela temporada. Apesar do excelente resultado, o time acabou caindo de divisão.
Ao contrário do que muitos pensam, isso motivou ainda mais Lucas. O brasileiro passou a estudar mais sobre o futebol inglês, o clube, os torcedores e criou a página Norwich City FC Brasil.
Os anos passaram, mas a essência era a mesma da criança que se encantou ao ver os gols de Ashton e McKenzie.
Lucas começou a chamar a atenção dos torcedores do Norwich nas redes sociais e recebeu o apelido de “Brazilian Canary”. O carioca de 24 anos começou a produzir conteúdo sobre o time em diversos meios – incluindo um podcast e um grupo de Whatsapp -, motivando também outros a torcerem pelo clube.
“Foi uma realização gratificante para mim, afinal, é um pouco chato torcer sozinho”, brinca La Torre, que ressalta o seu amor pelo Norwich City mesmo sem tantos companheiros ao seu lado. “Isso nunca me fez diminuir o amor pelo clube, pelo contrário, cresceu mais e mais”.
“É como dizem, nunca é ou nunca foi apenas futebol“
Lucas La Torre chamava cada vez mais a atenção da imprensa britânica. Um torcedor do Norwich City de tão longe era algo novo e raro. Apesar de acabar dando entrevistas para grandes veículos de comunicação do Brasil e da Inglaterra, nada foi tão emocionante para o torcedor quanto o convite que recebeu em 2018.
O Norwich City, por e-mail, convidou o brasileiro para conhecer o estádio Carrow Road, o mesmo palco que, 13 anos antes, havia recebida a partida que encantou Lucas.
“A partir do convite, minha vida se voltou para a realização desse sonho que era ir ver o time que eu amo. É como dizem, nunca é ou nunca foi apenas futebol. No e-mail, o clube dizia que seria uma honra me ver lá, que eles eram muito gratos pelo que tenho feito e isso, não é algo comum de um clube de futebol fazer para um torcedor. Sem dúvidas me emocionei e aceitei o convite.”
Tratamento VIP e encontro com ídolos
Meses depois, Lucas realizou o seu sonho, visitou o estádio de Norwich e assistiu a uma partida dos Canários. Mais do que o empate contra o Sheffield Wednesday por 2 a 2, o brasileiro viveu uma experiência “perfeita”.
“Todos queriam me ver, falar comigo, tirar fotos, me agradecer e até mesmo pedir autógrafo! Dá pra acreditar nisso? Eu me senti muito honrado. Ao chegar no estádio me levaram pra conhecer todo o Carrow Road, tour completo, da sala de entrevistas até o campo. Antes do jogo o clube me deu um tratamento VIP, eu pude conhecer até a dona do clube Delia Smith. Depois disso, quem apareceu foi Grant Holt. O ex-jogador e ídolo do Norwich estava lá e tive a enorme felicidade de conhecê-lo.”
Se fosse no Brasil, seria um “oi, tudo bem? Tchau”
Lucas La Torre viveu um dia único no leste da Inglaterra. O brasileiro, que, há 14 anos, estava passeando pelos canais e encontrou um jogo da Premier League que mudaria a sua vida, pôde ouvir uma torcida inteira te homenageando.
“Depois fomos para o jogo, fiquei no SnakePit, a principal torcida do Norwich. Cantamos até ficar sem voz. Bom, eu fiquei. No intervalo, veio o melhor, a volta olímpica dos Global Canaries. Como eles chamam “The Global Canaries Parade”. Todos me acenando, cantando “Is just like watching Brazil”, me deram a mão para apertar e até ganhei um chapéu! Quando terminamos foi difícil acreditar.”
A experiência de Lucas ficava cada vez mais surpreendente com o passar das horas. Após o jogo, o Brazilian Canary acabou conhecendo Daniel Farke, treinador do Norwich.
“O mais impressionante foi a grande atenção que todos me deram. Acho que se fosse no Brasil provavelmente seria um “oi, tudo bem? Tchau”. Mas pude conversar bastante com Holt e tirar algumas dúvidas.”
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“Tudo aconteceu melhor do que eu imaginava. Estou até mal acostumado com tanto carinho que recebi de volta. Você colhe o que planta. Eu sempre plantei amor por esses torcedores e clube. Acho que fazer as coisas com o coração foi a melhor coisa possível. Sabe, pra muita gente é um sonho bobo. Mas é melhor realizar um sonho que pra uns pareça bobo, do que nunca realizar um sonho. Por isso que digo que vivi meu conto de fadas”