Hillsborough 96: Ninguém caminha sozinho

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No futebol da Inglaterra, ninguém caminha sozinho. Com a divulgação de um relatório que isenta a torcida de qualquer responsabilidade na Tragédia de Hillsborough, que matou 96 pessoas durante a semifinal da Copa da Inglaterra de 1989, o Liverpool teve muito o que comemorar.

A família das vítimas nunca acreditou que seus entes queridos e perdidos tinham responsabilidade nas próprias mortes. Persistiram, nunca esqueceram esse assunto, e 23 anos depois foram recompensados com a verdade: a polícia adulterou 164 depoimentos para transferir a culpa aos torcedores.

Uma vitória para eles e para o Liverpool. Uma vitória que foi apropriada pelos outros clubes da Inglaterra, que poderiam tê-la ignorado, ou a usado como provocação.

Ao contrário, torcedores do Arsenal reuniram-se para cantar o hino dos Reds, “You Will Never Walk Alone”, música que tocou nos alto-falantes do Britannia Stadium durante o jogo entre Stoke City e Manchester City.

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A rivalidade entre Everton e Liverpool é uma das maiores da Inglaterra, mas isso não impediu o clube azul de mandar seus gandulas utilizarem uma camisa com o número 96 nas costas. Nem de entrar em campo para enfrentar o Newcastle com dois mascotes, um com o uniforme do Liverpool e o número 6, e outro com o do Everton e o número 9.

Os nomes de todos os mortos foram passados no telão, ao som da balada “He ain’t heavy, he’s my brother”, antecedendo a mensagem final, Merseyside United. Das cenas mais emocionantes que o futebol pode produzir.

Não gosto de comparar países e culturas diferentes, mas há certos princípios que deveriam ser consenso em qualquer lugar. Um deles é a força da união.

Enquanto neste país abençoado por Deus e bonito por natureza misturam rivalidade com inimizade, os clubes ingleses se juntaram para fundar a Premier League, motivados por Hillsborough, e revolucionaram entre outras coisas, os estádios do país.

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A competição tornou-se a mais lucrativa do mundo. Por aqui, não há união nem para vender direitos autorais a um jogo de videogame.

Sempre há idiotas e isso não tem como evitar. Apesar dos apelos de Alex Ferguson, alguns torcedores do Manchester United, uma minoria, segundo os jornais ingleses, cantaram “always the victims, it’s never your fault”.

Em tradução livre: sempre as vítimas, nunca é culpa de vocês. Ferguson condenou a atitude dos seus fãs. O clube também.

Essa música não se refere especificamente a Hillsborough, começou a ser cantada após as ofensas racistas de Luis Suárez a Patrice Evra na temporada passada, mas é uma coincidência impressionante, não? Alguns fãs do Liverpool também gostam de provocar os Red Devils lembrando o acidente de Munique.

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Há centenas de coisas mais importantes que o futebol, mas ele reflete muito bem alguns aspectos da vida. Alguns gostam de ter amigos, companheiros, parceiros.

De se misturar, conhecer coisas novas, pessoas novas. Outros preferem caminhar sozinhos, em uma bolha, e nunca sair dela. Por medo ou por arrogância. Esses perdem muita coisa. E infelizmente nem percebem.

A belíssima homenagem do Everton em Goodison Park, antes do duelo contra o Newcastle:

Em tempo: Antes que comecem os ataques (colonizado, puxa-saco, zzzzzzz), vou deixar claro que o povo britânico não é perfeito, maravilhoso, lindo e musculoso.

É também hipócrita e conservador, características escancaradas neste final de semana quando uma revista francesa publicou fotos da duquesa Kate Middleton sem a parte de cima do biquini. Seminua.

A BBC, por exemplo, criticou as publicações que divulgaram as imagens. Agora, a imprensa inglesa não faz a mesma coisa? Onde estava a autoridade moral da BBC quando o site americano TMZ mostrou fotos do príncipe Harry pelado e os tabloides reproduziram?

  • Por Bruno Bonsanti (@brunobonsanti)
Luccas Oliveira
Luccas Oliveira