Contaremos hoje sobre a passagem de Gerard Piqué no Manchester United. Multicampeão com o Barcelona e com a seleção espanhola, o zagueiro jogou pouco, mas já era muito promissor nos tempos em Old Trafford.
A política do Barcelona motivou a mudança de ares
A contratação de Piqué em 2004 causou certa surpresa em Barcelona. O jogador fez parte do time de juvenis que marcou história na La Masia. Eles cansavam de ganhar jogos com o marcador para lá dos dois dígitos.
Seus companheiros, Lionel Messi, Cesc Fábregas e Victor Vasquez – o último, não muito conhecido, tinha números equivalentes ao do argentino na época de base –, brincavam com a bola e certamente fizeram parte da melhor equipe de base da história da Cantera, conhecida como Geração de 1987.
Gigante na altura e também no talento, o até então extremamente magro defensor era fenomenal na saída de bola e também sempre aparecia lá na frente para marcar seus golzinhos.
Martin Ferguson, irmão do Sir Alex, e Mick Brown, ambos olheiros e scouts do clube, viram algumas partidas do garoto que tinha apenas 16 anos na época e tiveram de brigar contra outros ingleses por Piqué.
Steve Rowley e Francesc Cagigao trabalhavam para o Arsenal e estiveram como “torcedores” em partidas daquela geração do time catalão. Não conseguiram o zagueiro, como já podem ter visto neste texto. O jogador que foi contratado se chama Cesc Fabregas, que virou ídolo e participou dos Invencibles.
Gerard, que havia aceitado a proposta inglesa em dezembro, passou a ser tratado aquém do que merecia pelo clube. Por ter apenas 16 anos, o Barcelona apelou para o emocional, colocando-o entre os jogadores menos prestigiados do clube juvenil. Além disso, ele chegou a nem poder treinar nos locais de treinamentos da La Masia.
Leia mais: As 10 piores contratações do Tottenham na era Premier League
O motivo da mudança de ares do neto de Amador Bernabéu, grande nome da história como dirigente do clube catalão, e o de Cesc foi a política que deixava de ser usada no Barcelona após saída de Johan Cruyff em 1996. Eles passaram a investir em craques e não na Cantera.
Foi assim, em julho de 2004, que Gerard Piqué chegou ao poderoso clube inglês. No elenco, viu grandes nomes na sua frente na escolha do treinador escocês Sir Alex Ferguson.
Ele era muito jovem e tinha acabado de chegar a um clube inglês. Precisava de tempo por ser muito novo e também por não ser acostumado com o futebol físico da Premier League.
Na primeira temporada como jogador do Manchester United, oscilava muito entre o time reserva e os principais atletas da equipe. Jogou três partidas.
A estreia contra o Crewe Alexandra na Copa da Liga com 23 minutos em campo foi boa para o jovem, que ainda tinha apenas 17 anos, mas era muito pressionado por boas atuações.
Já os jogos contra Fenerbahce, na fase de grupos da Liga dos Campeões, e Exeter City, pela FA Cup, melhoraram esta relação entre torcida e o jogador que chegou como um dos defensores mais promissores do mundo.
Aos poucos, o gigante defensor foi ganhando suas oportunidades. Como muitos nomes que Martin Ferguson havia indicado naquela época, Piqué era um nome que gerava expectativa da torcida e só precisava ser lapidado por Alex.
A importância do empréstimo ao Zaragoza
Depois de uma temporada novamente como uma peça tão preciosa quanto rara, mas que ainda precisava de um preparo para brilhar o mais reluzente brilho possível, Gerard precisava jogar, ganhar rodagem, algo típico dos ingleses.
Foi assim que Gerard Piqué chegou ao Zaragoza em 2006/07 para fazer uma das suas melhores parcerias da Espanha. Com Gabriel Milito, foi companheiro como zagueiro e até como volante, dada sua excelente saída de bola.
Esse empréstimo gerou ao jogador espanhol, que tinha apenas 19 anos, um proveitoso momento para evoluir e chamar a atenção do Barcelona, seu antigo clube – que passaria ser o seu atual poucas temporadas depois.
Com 25 partidas pelo Zaragoza, marcou seus primeiros gols como atleta profissional. No fim, foram 3 tentos e 8 cartões amarelos em 1814 minutos em campo.
Mais do que isso. Eles conseguiram bater Barcelona, Sevilla e Villareal e arrancaram um empate com o poderoso Real Madrid. Para fechar, quando Pique retornou a Old Trafford e Milito se transferiu ao Barcelona, o Zaragoza foi rebaixado de divisão.
Você acha que a saída dos dois tem relação com a queda do time na temporada, já que na anterior havia ficado há seis pontos da vaga na Liga dos Campeões? Tire suas conclusões.
Piqué no Manchester United: relação curta e intensa
Quando Piqué retornou, Alex prometeu para ele que agora sim seria tratado como jogador de nível para ser titular na equipe de Manchester. O número estipulado pelo treinador de oportunidades era de 25 partidas. Chegou apenas na metade disso.
Apesar da altura, Gerard sempre soube tratar bem a bola. Por isso, teve muitas oportunidades como lateral, que sentia certa dificuldade quando Gary Neville ou Evra não podiam jogar.
Uma das partidas mais emblemáticas da sua passagem pelo Manchester United foi contra o Bolton, válida pela quarta rodada da Premier League 2007/08.
Como ele mesmo descreve, em entrevista para o The Players’s Tribune, tinha que aproveitar aquela oportunidade. Quando viu Anelka dominar a bola depois de uma jogada aérea do Bolton, nas suas costas, e marcar o gol, pôde ver também que Alex não confiaria mais nele.
“Eu cai e me virei horrorizado. O Anelka controlou a bola e marcou facilmente. Acabamos perdendo por 1 a 0, e foi minha culpa. Como um jovem defensor, quando você comete um erro como esse, o treinador simplesmente não pode mais confiar em você. Mesmo que ele queira, ele não pode. Eu poderia dizer, literalmente no momento em que Anelka controlava a bola, que eu havia perdido a fé de Sir Alex e provavelmente a fé da maioria dos torcedores do United.”
Depois disso, no final daquela mesma temporada, ele teve uma chance maravilhosa para se redimir com a torcida. Era uma semifinal de Liga dos Campeões e o sorteio reservou um confronto entre o até então atual time de Piqué e o time que o formou e sempre fora apaixonado.
Ele estava longe de ser cogitado para jogar aquelas partidas. Entretanto, após Nemanja Vidic ter se contundido, o espanhol passou a ser o substituto natural do zagueiro.
Leia mais: Elegemos os uniformes mais bonitos da era Premier League
Mas não foi. Sabe qual foi o motivo? Alex Ferguson sabia, a torcida não, mas passou a entender meses depois. Piqué tinha recebido uma oferta para retornar ao Barcelona, o rival daquela partida eliminatória.
Pique ficou triste no primeiro momento quando soube, mas logo entendeu e respeitou a ordem de Alex. Aliás, era Sir Alex Ferguson e ele é uma divindade em Old Trafford quem dava as ordens e era também o Barcelona quem o queria. Quem se revoltaria em meio a todo este contexto?
No final daquela temporada, terminou-se também sua passagem pela Premier League, pelo Manchester United. Após 4 anos, Gerard Piqué estava de volta à Barcelona.
Com 23 partidas, 2 gols e uma assistência, o zagueiro evoluiu muito em solo inglês. Se ele já tinha uma excelente saída e controle de bola, aprendeu a ter mais disposição física, mais força nos combates e melhorou efetivamente suas bolas aéreas.
Ele, que sempre foi muito alegre e que gostava muito de piadas e de um clima mais engraçado nos vestiários, conseguiu se tornar muito profissional. Grande parte dos jogadores na Inglaterra, apelidados como “baladeiros”, por gostarem de ir a pubs e casas noturnas em dias de folgas, eram extremamente apaixonados e dedicados pelo que faziam – e isso foi algo que Pique aprendeu e demonstrou nos anos seguintes.
Elogios, elogios… e mais elogios
Piqué retornou ao Barcelona custando cerca de 5 milhões de euros. Valor alto para um jogador já era do clube 4 anos antes. Mas não era o mesmo atleta. Parecia um aluno que volta de intercâmbio extremamente diferente, com culturas e experiências que sempre o levam à evolução.
Grande parte disso se deve à passagem de Piqué no Manchester United. Em entrevista para Graham Hunter, escrito do livro Barça, ele disse:
“Sobre Alex Ferguson, preciso dizer que, apesar de eu não jogar muito, tive um relacionamento muito bom com ele, que sempre foi muito direto comigo. Há algums treinadores que se escondem de você quando não o escalam, mas nunca tive esse problema, nós conversávamos abertamente. Tivemos um bom relacionamento. Ele foi um segundo pai para mim.”
Na mesma entrevista, Gerard Pique disse que foi uma grande experiência ter jogado ao lado de Rio Ferdinand, Vidic. Além deles, atuar com Cristiano Ronaldo, Van Nistelrooy e Rooney também foi dignificante para o espanhol.
“Fui para lá quando tinha dezessete anos e voltei para o Barcelona com 21. O Gerard que saiu daqui é muito diferente do que voltou”, completou o promissor zagueiro da seleção espanhola e campeão da Liga dos Campeões duas vezes com apenas 21 anos, já que vencera com o time catalão na primeira temporada no clube como profissional.
Embora muitos não a conheçam, a história de Gerard Piqué no Manchester United foi boa para ambos os lados. Para o espanhol, a aprendizagem com grandes nomes do futebol mundial e o estilo de jogar do campeonato inglês foi maravilhosa.
Já para os Reds Devils, ter Piqué como um jogador que passou pelo clube deve os encher de orgulho e admiração pelo zagueiro multicampeão no Barcelona e na Fúria.