O ano é 2005, em um hospital de Londres. Um homem, com sua saúde fragilizada, permanece ao lado de sua família e de um amigo esperando com certa melancolia o momento de sua iminente morte. Era George Best.
No dia 20 de novembro, abre uma concessão para pessoas da imprensa. Eles poderiam fotografá-lo para que servisse de exemplo a uma geração. A foto revela um homem fraco e com tonalidade amarelada devido aos muitos problemas de fígado e a deterioração de seus rins.
Cinco dias após a fatídica derradeira fotografia, ele perde a batalha e vem a falecer devido a falência múltipla de órgãos, mas não sem antes notar uma carta permanecia encostada perto do leito e que trazia a assinatura em sua frente:
“Do segundo melhor jogador de todos os tempos, Pelé”. O homem era George Best, o maior jogador de futebol de todos os tempos, segundo o Rei brasileiro do futebol.
O início de George Best
George Best nasceu em Belfast, capital da Irlanda do Norte em 22 de maio de 1946. Foi criado no protestantismo da Igreja Presbiteriana e, aluno brilhante que era, acabou sendo aceito na Grosvenor High School.
Mas por se tratar de uma instituição com tradição no rugby, ele logo conseguiu sair de lá e foi para Lisnasharragh Secondary School, onde pode se focar no futebol que era sua paixão.
Em uma parede do Museu do Futebol em Manchester está uma declaração que ilustra seu amor pelo esporte desde criança: “Após a escola, nós costumávamos jogar até a hora de dormir. Meus pais tinham que vir procurar por mim todas as noites”, afirmou Best.
Sua vida começou a mudar quando tinha 15 anos enquanto jogava bola em Belfast. Um olheiro do Manchester United, Bob Bishop, que estava na região o viu jogar e mandou um telegrama para Matt Busby, então técnico dos Red Devils, com as seguintes palavras: “Eu acho que encontrei um gênio para você”.
Após uma certa demora para adaptar-se à nova realidade na industrial cidade de Manchester, Best fez sua estreia profissional na primeira divisão em 14 de setembro de 1963, quando tinha 17 anos e seu primeiro gol saiu dois meses depois. A partir desse ponto uma lenda começava a emergir no cenário futebolístico inglês.
Ascensão
Best atuava como ponta direita. Era rápido, extremamente habilidoso, driblador e provocativo. Tanto é verdade que chegaram a descrever Best como um “brasileiro nascido na Irlanda do Norte”, por sua personalidade expansiva, carismática e seu jogo habilidoso e alegre.
Entretanto, isso era notado por seus adversários que costumavam chegar de maneira dura e agressiva no norte irlandês. Por isso, seu técnico desenvolveu um tipo de treinamento especial para ele, no qual o próprio Busby considerou como “feroz, às vezes brutal”, para adaptar o atleta à realidade que enfrentaria no campo.
Na temporada 1963-64, Best não foi titular absoluto, mas fez 26 jogos, marcando 6 gols. No ano seguinte fez parte do time principal e ajudou o clube a ser campeão inglês, com 14 gols em 59 jogos.
Em 1969, Joe Mercer, então técnico do Manchester City, deu a seguinte declaração sobre Best: “Parece impossível machucá-lo. Todo mundo já tentou intimidá-lo. Best meramente desliza, esquivando dos desarmes e deixando gigantes para trás como se fossem folhas de árvore.”
Today, we remember the legendary George Best and Bill Foulkes, who we sadly lost on this day in 2005 and 2013 respectively ❤️#MUFC pic.twitter.com/nVYoKt29BK
— Manchester United (@ManUtd) November 25, 2023
“O 5º Beatle”
O jogador chegou ao estrelato mundial com 19 anos quando marcou 2 gols nas quartas de final da Copa Europeia contra o Benfica em pleno Estádio da Luz. Após esse dia, a mídia portuguesa começou a chama-lo de “O quinto Beatle”. O apelido pegou rapidamente e assim nascia a lenda dentro e fora de campo.
O auge de sua carreira no futebol se deu no ano de 1968, quando os Red Devils conquistaram a Copa Europeia jogando em Wembley e venceram o mesmo Benfica de Eusébio por 4 a 1 na final, com Best anotando um golaço.
Embora não tenha jogado naquela partida, Denis Law foi fundamental para aquela temporada do Manchester. Juntos (Best e Law) com Bobby Charlton, formaram a famosa United Trinity (Trindade do United).
Tão espetacular era essa parceria que o trio ganhou posteriormente uma estátua colocada bem na porta do Teatro dos Sonhos, o Old Trafford, estádio do clube.
Nesses dois anos Best ganhou o prêmio de Melhor Jogador atuante na Inglaterra. Além de ganhar o Ballon d’Or (Bola de Ouro), Jogador Europeu do Ano, a Liga Inglesa e a Copa Europeia. Tudo isso com 22 anos apenas!
Paralelamente ao seu absurdo talento no futebol, Best levava uma vida absolutamente desregrada. Era conhecido por suas frases polêmicas e por seu amor por bebidas, mulheres e carros.
Um total contraponto ao jogador “politicamente correto” do mundo de hoje. Atrasava-se a muitos treinos, faltava em mais vários, mas seu rendimento em campo ainda era excelente, por isso prosseguia com toda sua rotina.
The boy from Belfast.
Celebrating the late George Best on what would have been his 77th birthday ❤️ pic.twitter.com/vPPCjRs3Jq
— Manchester United (@ManUtd) May 22, 2023
O fim de um craque
No entanto, no começo dos anos 70 a vida de Best começou a degringolar após a saída do United em 1974. Acabou se tornando um alcoólatra ainda cedo e isso o levou à morte.
Saiu dos Red Devils e passou a ser emprestado a vários clubes, quase nunca ficando uma temporada completa sequer. Sempre sendo expulso da maioria deles devido a indisciplina e seu vício. Foi jogar na Índia, Estados Unidos, África do Sul e Escócia.
Há um episódio de sua vida em 1981, quando estava nos Estados Unidos, em que Best roubou dinheiro de uma senhora, após ela ter ido ao banheiro deixando a bolsa na mesa, para pagar as bebidas que tinha consumido. George foi preso algumas vezes por seu comportamento inadequado.
Já aposentado, mas ainda sofrendo com os problemas do alcoolismo, Best apareceu em uma entrevista em 1990 totalmente bêbado e não deixou de soltar algumas pérolas.
Depois ele se desculpou e reconheceu que este foi um dos mais vexatórios episódios de seu alcoolismo. Em 2002, precisou fazer um transplante de fígado. Poucos dias após a cirurgia, porém, voltou a beber novamente.
Após diversas complicações, Best foi internado em 2005 e nunca mais saiu do hospital. Faleceu por uma infecção no pulmão e falência múltipla de órgãos. Como já dito acima no começo do texto, ele pediu para ser fotografado em seu leito de morte e deixou uma mensagem a todos alertando sobre os perigos do alcoolismo: “Não morra como eu”.
Cinco dias depois, em 25 de novembro de 2005, Best deixou este mundo. Ele tinha 59 anos. Uma lenda que se foi muito cedo com um legado controverso. Alegrias e tristezas sobrepostas e aglutinadas.
Homenagens a George Best após sua morte
George Best foi homenageado em vida por Pelé, que afirmou que ele foi o maior jogador de todos os tempos. Sua morte foi sentida por toda comunidade futebolística do mundo e por toda a Grã-Bretanha.
Craques como Johan Cruyff, Maradona, Eric Cantona e tantos outros demonstraram solidariedade e admiração ao eterno camisa 7 do Manchester United.
O norte irlandês nunca chegou a disputar uma Copa do Mundo, pois sua seleção nunca conseguiu se classificar. O quanto isso influenciou na fama dele? Por que quase não se dá atenção ao maior jogador de todos os tempos, de acordo com o próprio Pelé?
Na Irlanda do Norte e em Manchester existe um ditado que explica tudo muito bem: “Maradona good, Pelé better, George BEST” (Maradona foi bom, Pelé melhor, George foi “O” melhor!”.
Frases de George Best
“Em 1969, eu abri mão de mulheres e bebidas e foram os piores 20 minutos da minha vida”.
“Gastei muito dinheiro em bebida, mulheres e carros rápidos. O resto eu desperdicei”.
“Eu parei de beber, mas apenas enquanto eu durmo”
(Um repórter anotava o número de Best e disse: “Você sabe que metade das mulheres do mundo pagaria muito dinheiro para ter esse número). Best respondeu: “Metade das mulheres do mundo tem esse número”
“Eu nasci com um grande dom, e às vezes isso acaba se tornando destrutivo. Da mesma forma como eu queria superar todo mundo enquanto eu jogava, eu tinha que superar todo mundo quando eu estava fora, na cidade.” – falando sobre seus excessos