O que o futebol inglês tem feito para cuidar da saúde mental de seus atletas

4 minutos de leitura

Steve Harper, Gary Neville, Steven Caulker, Danny Rose, Michael Carrick, Aaron Lennon e Anthony Knockaert. A lista de nomes poderia ser a formação de um time, mas, na verdade, nela constam atletas e ex-atletas da elite do futebol inglês que assumiram terem enfrentado depressão. Nos últimos anos, a preocupação com a saúde mental entre jogadores, mas também fora dos gramados.

A depressão e a ansiedade vêm afetando cada vez mais a população mundial ao longo dos últimos anos. O número de pessoas que vivem com depressão aumentou 18% entre 2005 e 2015, segundo estudo da Organização Mundial da Saúde publicado em 2017.

Há três anos, o francês Anthony Knockaert era um dos principais nomes do Brighton, que postulava uma vaga na Premier League. Mas fora de campo as coisas não estavam nada fáceis. A vida do atleta foi virada de cabeça para baixo, o que o levou à depressão.

“Me divorciei no ano passado e foi difícil, especialmente depois que meu pai faleceu. Quando perdi ele, a coisa mais importante para mim era minha esposa e meu bebê. Então, percebi que não estaria com meu filho todos os dias. Eu estava passando por um período muito ruim e foi muito difícil”, disse Knockaert à BBC Sussex.

Brighton-Knockaert Dan Istitene Collection Getty Images Sport
Dan Istitene Collection Getty Images Sport

Leia mais: Este texto de Lukaku é tão emocionante que não tem como não virar fã do belga

Foi conversando com o lateral e capitão do Brighton, Bruno, que o companheiro de equipe levou a questão ao técnico Chris Hughton. Preocupado, o treinador dos Seagulls indicou uma psicóloga para ajudar Knockaert.

“Comecei a ficar um pouco melhor e melhor, ela (psicóloga) me ajudou muito. Eu a vi por alguns meses e, desde então, estou muito feliz de novo”, revelou o francês.

Em maio deste ano, a Professional Footballers’ Association (Associação dos Jogadores de Futebol na Inglaterra e no País de Gales ou PFA) divulgou um número recorde de jogadores que estão buscando ajuda médica para tratar da saúde mental. A previsão da organização é de que o número de pedidos em 2019 seja o dobro ou até triplo do registrado em 2018.

De janeiro a maio deste ano, 355 jogadores buscaram terapia. Já durante todo o ano de 2018, foram 438 atletas. Dois anos antes, apenas 160 jogadores tinham procurado ajuda.

A entidade se aprofundou no cuidado com a saúde mental especificamente a partir de 2011. Em novembro daquele ano, Gary Speed, campeão inglês com o Leeds e quinto jogador com mais partidas disputadas na era Premier League, foi encontrado morto enforcado dentro de casa.

Gary Speed Michael Regan Collection Getty Images Sport-min
Michael Regan Collection Getty Images Sport

Leia mais: Justin Fashanu: o primeiro jogador a assumir sua homossexualidade

Desde então, a PFA passou a se preocupar mais com a saúde mental dos atletas. Hoje, fornece aconselhamento em uma linha telefônica de suporte 24 horas por dia, realiza oficinas regulares em clubes, além de sediar a Injured, uma conferência anual sobre saúde mental.

O diretor de assistência social da entidade, Michael Bennett, está determinado a oferecer o apoio que lhe faltou quando ficou lesionado por nove meses quando era jogador. “Eu precisava desesperadamente de apoio, mas não havia nenhum disponível, então, depois que desisti de jogar, quis oferecer esse serviço aos jogadores”, contou ao Telegraph.

Há dois anos, o lateral Danny Rose ficou oito longos meses fora dos gramados, se recuperando de uma lesão no joelho direito, e tomou uma série de remédios, além de injeções para acelerar a recuperação. Os problemas físicos se juntaram a dramas familiares, o que o levou à depressão.

“Ninguém sabe disso, mas meu tio cometeu suicídio durante a minha recuperação, e isso também serviu como um gatilho para a minha depressão. Em agosto, minha mãe foi vítima de racismo na cidade de Doncaster. Depois, uma pessoa foi à minha casa e quase atirou no rosto do meu irmão. Meus amigos me chamavam para fazer coisas e eu não queria sair. Só ia para casa para ir direto para a cama”, desabafou ao Guardian.

Danny Rose Tottenham saúde mental depressão Stephen Pond Collection Getty Images Sport
Stephen Pond Collection Getty Images Sport

Leia mais: PL Brasil entrevista Edu Gaspar: como o meia superou dramas para vencer no Arsenal

Embora abalado psicologicamente, o jogador não estava sozinho. O Tottenham identificou o problema e recomendou um psicólogo para ajudar Rose, que chegou a tomar remédios durante o tratamento.

Apesar da ajuda dos Spurs, um estudo publicado pela Brunel University London identificou que os clubes ingleses são “negligentes” em seu dever psicológico de cuidar de jogadores com lesões sérias de longo prazo.

Aaron Lennon Burnley Dan Mullan Collection Getty Images Sport
Dan Mullan Collection Getty Images Sport

Há dois anos, o veterano Aaron Lennon, ex-seleção inglesa, foi internado em um hospital psiquiátrico depois de ser encontrado por policiais nos arredores do centro de Manchester em um estado preocupante.

Ele acabou sendo levado a um hospital para avaliação e cuidados médicos. Hoje, Lennon deu a volta por cima e tem usado sua experiência para aconselhar companheiros de clube da importância do cuidado da saúde mental.

“Eles queriam saber o que eu tinha passado e onde obter ajuda. Provavelmente ainda existem jogadores por aí que não querem falar sobre nada com ninguém. Eu sei porque é exatamente assim que eu era. Mas minha mensagem seria falar com alguém porque há muita ajuda disponível e pode realmente faz a diferença”, disse ao Guardian.

O CVVCentro de Valorização da Vida – realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, por telefone, e-mail, chat e 24 horas todos os dias.

A ligação para o CVV em parceria com o SUS, por meio do número 188, são gratuitas a partir de qualquer linha telefônica fixa ou celular. Também é possível acessar www.cvv.org.br para chat, Skype, e-mail e mais informações sobre ligação gratuita.

Pedro Ramos
Pedro Ramos

Editor da PL Brasil entre 2012 e 2020 e subcoordenador na PL Brasil desde 2023. Passagens pelo jornal Estadão e o canal TNT Sports. Formado em Jornalismo e Sociologia. Ex-pesquisador do GEMAA (Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa).

E-mail: [email protected]