O Fair Play Financeiro (FPF) é um termo comum pra quem acompanha o futebol. Na Premier League ele passou a carregar outra sigla: PSR (Regras de Lucro e Sustentabilidade, em português), mas as normas e os objetivos são os mesmos.
O Fair Play Financeiro da Premier League está em vigor desde a temporada 2015/2016, mas a liga tem sido mais rígida nos últimos anos. Everton e Nottingham Forest foram os últimos clubes punidos por questões financeiras. Ambos sofreram dedução de pontos.
Mais recentemente, o Leicester venceu uma ação judicial e conseguiu evitar sanções da Premier League por supostas violações das regras.
Por que o Fair Play Financeiro foi criado?
A Uefa foi pioneira ao estabelecer o Fair Play Financeiro no futebol europeu, em 2011. Ele serviu como espelho para as regras criadas anos depois pelas cinco principais ligas da Europa — Premier League, Serie A, Bundesliga, Ligue 1 e La Liga.
À época, não havia regulamentação para contratações. Então, os clubes podiam realizar gastos excessivos em reforços. O estopim veio em 2010. Somados, os times das cinco principais ligas europeias registraram prejuízo de 1,6 bilhão de euros, juntamente com níveis de dívidas sem precedentes na casa dos 19,1 bilhões de euros (um aumento de 1% em relação a 2009), segundo dados da própria Uefa.
Foi nesse contexto que a entidade anunciou a criação do Fair Play Financeiro. O objetivo era melhorar a saúde financeira dos clubes classificados para a Champions League e Europa League. Todos deveriam cumprir com as regras para participar das competições internacionais. Caso contrário, seriam excluídos.
Inicialmente, órgão europeu restringiu as perdas a não mais de 5 milhões de euros ao longo de três anos. No entanto, os clubes ainda tinham uma carta na manga para ultrapassar o valor permitido. Isso por que a Uefa autorizava que os proprietários das equipes cobrissem as despesas dos clubes em até 30 milhões de euros.
Por exemplo, se uma equipe apresentava 10 milhões de euros de perda no período de três anos, o dono do clube poderia injetar 5 milhões da sua “renda pessoal” e, assim, cobrir o valor suficiente para a equipe não ser punida pelo fair play.
Porém, esse sistema mudou na temporada 2023/2024, pois a Uefa estabeleceu uma porcentagem para os gastos ao invés de um valor fixo. Inicialmente os times poderiam gastar até 90% das receitas com transferências e salários na temporada. O número diminuiu para 85% em 2024/2025 e a partir da próxima temporada, os times poderão investir no máximo 70% de suas receitas.
Assim como na Premier League, a Uefa não utiliza o termo Fair Play Financeiro. A organização renomeou para “Regras de Sustentabilidade Financeira”.
O impacto na Premier League
A criação das regras do Fair Play Financeiro traz a impressão de restrição aos clubes, mas tem um impacto significativo na saúde financeira deles. Em um estudo publicado em março de 2024 na “Revista Internacional de Análise Financeira” (IRFA, na sigla em inglês), veículo científico especializado em pesquisas financeiras, foram encontradas evidências de melhora nas cinco principais ligas.
Na Premier League, isso fica evidente na lucratividade da liga. A “IRFA” fez um levantamento com os dados financeiros de 37 clubes ingleses que participaram de pelos menos duas temporadas da Premier League entre 2005 e 2019. Depois da criação do PSR, houve um aumento de 11% na receita geral.
Isso se deve principalmente aos direitos de transmissão televisivos. Os valores pagos correspondem a 36% da receita total dos clubes ingleses atualmente, segundo o estudo.
Entre 1992 e 1997, o acordo por cinco anos de transmissão era de 231 milhões de libras. Esse número passou para 9,2 bilhões de libras no acordo de três anos entre 2019 e 2002. Isso representa um crescimento de 112%.
Mas o grande motivo por trás do impacto positivo do Fair Play na liga inglesa é a melhoria na gestão financeira. Com o estabelecimento do limite de gastos, os clubes começaram a controlar melhor o caixa.
Ainda segundo o estudo, as equipes passaram a negociar melhor os acordos quando vendem jogadores. Isso resultou em lucros e valorização dos atletas durante as janelas de transferências, com um aumento de 109% em lucro nas vendas.
Em contrapartida, as despesas cresceram 75%, saindo de 75,1 milhões para 131,1 milhões de libras. Os salários dos jogadores também aumentaram em 88%, chegando à média de 74,3 milhões de libras, o que representa 58% das despesas dos clubes.
O estudo conclui que o lucro dos clubes ingleses aumentou com a criação do Fair Play, mas não dá para dizer que a sustentabilidade financeira melhorou. Isso porque, apesar de estarem ganhando mais e gerindo melhor os gastos, as equipe não sofreram uma redução significativa das dívidas, já que preferem focar os valores em comprar jogadores que pagar seus credores.
O FPF evita a criação de ‘novos City’?
Em vídeo publicado no seu canal no YouTube, o jornalista Fred Caldeira explica as mudanças e como o Fair Play Financeiro impactou os times na Premier League.
— Essa histórias não são mais possíveis. A Premier League conseguiu apertar o cerco. Olha o exemplo do Newcastle. Desde a chegada do dinheiro saudita, passou de um clube quase rebaixado para alguém muito bem estabelecido. Porém, não conseguiu e muito provavelmente não irá conseguir ter o mesmo salto que deram Chelsea e Manchester City.
Após grandes investimentos em anos anteriores à criação do Fair Play Financeiro, Manchester City e Chelsea subiram de patamar e se estabeleceram como favoritos aos principais títulos.
O Newcastle é um clube com muito dinheiro com o fundo de investimento público da Arábia Saudita após ser comprado em 2021. No entanto, a diretoria precisa reforçar o time respeitando as limitações impostas pelas regras do Fair Play Financeiro da Premier League.
O que é o PSR da Premier League?
De forma simples e resumida, o PSR é um conjunto de regras da Premier League criado para impedir que os clubes gastem mais do que eles arrecadam. Ela é a mesma desde a implementação na temporada 2015/2016.
Todos os 20 times da primeira divisão devem apresentar os documentos com as informações financeiras da temporada em uma data pré-estabelecida pela liga. Esse período é chamado de “ano financeiro”.
As regras do PSR da Premier League:
- Cada time da primeira divisão pode ter um prejuízo acumulado em três anos de, no máximo, 15 milhões de libras;
- A Premier League permite que o número chegue aos 105 milhões de libras, desde que os acionistas façam o aporte de 90 milhões de libras;
- Os proprietários podem comprar ações do clube para cobrir a dívida. É o chamado “Financiamento Seguro”;
- Os 20 times devem apresentar todos os documentos financeiros com os dados de gastos e ganhos do ano.
No entanto, as regras vão passar por uma mudança no próximo ano. Em abril de 2024, os times aprovaram por unanimidade a troca das normas do Fair Play Financeiro, em encontro realizado em Londres. O conceito é semelhante ao modelo atual e vai entrar em vigor já na temporada 2025/2026.
As novas regras do PSR da Premier League a partir da temporada 2025/2026:
- O limite de gasto passa a ser em porcentagem e não com um valor pré-estabelecido;
- Os times que irão disputar as competições europeias poderão investir 70% de suas receitas em transferências e salários;
- As equipes que não estão classificadas para as competições europeias podem gastar até 85% de suas receitas;
- A Premier League terá teto salarial: a folha salarial não pode ser cinco vezes maior que o time com menor valor dos direitos de transmissão.
Quais as punições por descumprir o PSR?
Caso um time descumpra as regras, a Premier League faz a denúncia formal e leva o caso para uma Comissão Independente. Se for considerado culpado, a equipe é punida. Mas pode entrar com recurso para rever a decisão.
O regulamento do PSR prevê de multas até expulsão da liga. No entanto, a mais utilizada é a dedução de pontos. Essa foi a sanção da Premier League com Everton e Nottingham Forest na temporada passada.
Os casos de Manchester City e Chelsea, por sua vez, são mais complexos e não há uma previsão de possíveis sanções. A audiência para tratar das supostas infrações cometidas pelos Citizens começou na segunda-feira (16).
Durante a reunião realizada no início do ano, a Premier League manteve a dedução de pontos como punição para o novo regulamento financeiro.