Com planos ambiciosos, Everton sofre para encontrar identidade

No último sábado, o Everton foi derrotado em casa pelo Wolverhampton em um confronto direto pela sétima colocação da liga, ou seja, o posto de “melhor time depois do Big Six”.

Muito além da derrota em si, os Toffees em nenhum momento conseguiram impor seu jogo ao bem treinado time dos Wolves e viram os adversários chegarem aos 38 pontos na 7ª posição, enquanto o Everton é o 9º colocado com 33.

Quando o investidor iraniano Farhad Moshiri se tornou sócio majoritário do Everton em 2016, muitos esperavam que o clube desse um salto de patamar.

Com mais dinheiro para investir, a expectativa em Goodison Park era que o time repetisse os percursos de outros clubes da Premier League e se consolidasse entre as maiores forças do futebol inglês, mas isso ainda não aconteceu.

O objetivo aqui não é analisar os resultados, até porque as campanhas do Everton nas últimas edições da Premier League foram bastante sólidas. Não podemos classificar a 7ª colocação em 2016/17 e a 8ª posição em 2017/18 como fracassos.

O ponto é outro: onde pode chegar no futuro o Everton e o que está sendo feito para que o clube figure de fato entre as maiores forças da Premier League?

Existem diferentes caminhos para que um time alcance esse patamar. Você pode chegar lá a partir de investimentos financeiros massivos, como fizeram Chelsea e Manchester City.

Ou você pode fazer investimentos menores, mas certeiros, e caminhar de maneira mais lenta e progressiva, como fez o Tottenham.

É evidente que o poder financeiro do Big Six faz diferença, mas apenas ter dinheiro em caixa não é a solução de todos os problemas. O Everton hoje tem recursos para investir mais, mas falha no planejamento, fator essencial para que o investimento tenha retorno dentro e fora de campo.

De uma forma ou de outra, a resposta passa por uma questão de identidade. Uma reflexão sobre onde se quer chegar e como se quer jogar para chegar lá. Quando o Chelsea começou o seu percurso no início dos anos 2000, não eram apenas montes de dinheiro sendo gastos aleatoriamente.

Foi desenvolvida em Stamford Bridge uma filosofia de trabalho, uma identidade de jogo. Todos os times do Chelsea desde o título em 2004/2005 tinham uma concepção tática semelhante: um time construído a partir de um sistema defensivo sólido.

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Todos os treinadores que passaram pelo Chelsea nesse período, ainda que com peças e esquemas diferentes, mantiveram essa filosofia. Desde os times que deram certo, como os de Conte, Mourinho ou Ancelotti, até aqueles que não deram tão certo. O Chelsea construiu ao longo dos anos uma identidade de jogo.

Hoje, quase duas décadas depois, o clube dá um passo rumo à construção de uma nova identidade. Sarri é o primeiro treinador dos Blues cuja filosofia de jogo parte de uma outra concepção tática.

No Manchester City, o processo foi semelhante, com uma filosofia diferente. Guardiola revolucionou o jogo, mas desde Manuel Pellegrini (de certa forma, até mesmo desde Mancini) os Citizens mostravam um jogo mais ofensivo e com mais posse de bola que o usual na Inglaterra. Guardiola é só a elevação dessa ideia, um passo acima dentro da mesma filosofia.

Ou seja: o projeto de crescimento de um time passa por etapas: a definição de um objetivo, a busca por uma identidade, o estabelecimento de uma marca no estilo de jogo e a consolidação de uma filosofia de trabalho.

Hoje, ainda não é possível identificar essas etapas no Everton. Desde a saída de Roberto Martínez, em 2016, o time teve mais trocas de treinador do que é aconselhado, e a diretoria parece incerta sobre o estilo de jogo que busca implementar na equipe.

A falta de coerência na escolha dos treinadores e estilos de jogo evidencia isso. O time foi treinado por Koeman, depois – pasmem – Sam Allardyce e agora Marco Silva, que já é questionado em Goodison Park após uma queda no rendimento da equipe.

Enquanto alguns clubes mantêm uma linha de trabalho, o Everton alterna técnicos e times que pouco ou nada dialogam entre si. Não existe uma continuidade na forma de trabalhar entre Koeman, Allardyce e Marco Silva.

A pergunta que fazemos, então, é: será que o Everton sabe mesmo o que quer do seu time? Ou apenas aposta em nomes até que algum deles dê certo?

Enquanto isso, times como o Wolverhampton, Watford e Bournemouth surgem com filosofias de trabalho e escolas táticas aparentemente mais sólidas que as do Everton.

Mesmo com maior capacidade financeira, os Toffees encontram dificuldades contra essas equipes e não conseguem se firmar no papel de “sétima força” inglesa.

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Com ou sem Marco Silva, o Everton precisa saber o que quer antes de definir sua identidade. E só a partir daí escolher o nome adequado ao projeto. Enquanto isso não acontecer, o clube vai encontrar dificuldades para fazer valer seu investimento.

Depois do Wolverhampton, o Everton terá pela frente o Manchester City, postulante ao título, e o Watford, outro adversário direto na briga pela sétima posição da Premier League.

Os resultados do Everton não são ruins, mas caso o clube queira mesmo dar um salto de patamar e ficar mais próximo do Big Six que dos outros times ingleses, é fundamental que exista o planejamento e a manutenção de um trabalho.

E paciência, porque, especialmente em um cenário absurdamente competitivo como o futebol inglês, vai ser preciso tempo para atingir esse patamar.

Felipe Altarugio
Felipe Altarugio

Jornalista formado na Unesp. Três anos na Jovem Pan, uma Copa do Mundo e ex-setorista do São Paulo FC.