No dia 22 de junho de 2020, na derrota do Burnley para o Manchester City pela Premier League por 5 a 0, o que mais chamou a atenção foi a escalação dos Clarets. Sean Dyche iniciou o jogo com 10 jogadores ingleses e apenas um estrangeiro, o que não acontecia desde 2006. O Burnley tem sido um time resistente às contratações de atletas estrangeiros desde sempre. O elenco atual é majoritariamente britânico, apenas 10 jogadores não são encaixam nesse perfil.
Apesar de ainda vermos alguns casos isolados na divisão de elite – O Sheffield United também possui apenas 10 jogadores estrangeiros em seu plantel – a realidade ampla é que, cada vez mais, a liga recebe jogadores de diversas nacionalidades, e se um clube quiser realmente competir por título, precisará adicionar qualidade de fora.
Elenco majoritariamente britânico é raridade atualmente
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— Everton (@Everton) March 2, 2017
O último time a conquistar o Campeonato Inglês com um elenco totalmente britânico foi o icônico Nottingham Forest de Brian Clough. O técnico contou com 21 jogadores, sendo 16 ingleses e cinco escoceses.
O Aston Villa foi campeão da liga em 1980/1981 com apenas três atletas não-britânicos no elenco. Os irlandeses Eamonn Deacy, que fez cinco jogos, e Terry Donovan, que não atuou em uma partida sequer, além do jamaicano Noel Black, que também não entrou em campo.
O Liverpool, que era o maior campeão da liga naquele período, nunca teve mais do que cinco jogadores não-britânicos em seu elenco. O Everton sagrou-se campeão em 1984/1985 com apenas um irlandês no time: Kevin Sheedy, um dos maiores ídolos do time azul de Liverpool.
O Arsenal conquistou o seu título na temporada 1988/1989 com um time quase todo inglês, à exceção de David O’Leart e Niall Quinn, ambos da Irlanda. Por fim, o Leeds United levantou o caneco em 1991/1992 com apenas três estrangeiros: o francês Eric Cantona, o irlandês Gary Kelly e o maltês Dylan Kerr.
Com a criação da Premier League, houve o crescimento em longa escala da marca e consequentemente dos clubes, atingindo níveis cada vez maiores de alcance. Porém, como em qualquer processo dessa natureza, o amadurecimento e expansão foi gradual.
Nos primeiros anos, ainda houveram alguns vencedores que dispunham de um elenco quase todo britânico, mas com a chegada dos anos 2000 isso se tornou extinto. Separamos quatro temporadas da Premier League onde o campeão tinha o seu elenco majoritariamente “da casa”.
Manchester United – 1992/1993
Maior vencedor da era Premier League, o Manchester United levantou o título inaugural da competição e estabeleceu uma dinastia vencedora com Sir Alex Ferguson. O treinador, que ganhou o seu último título da liga em 2012/2013 com 23 jogadores não-britânicos, levantou o primeiro caneco com apenas quatro.
O irlandês Denis Irwin, o russo Andrei Kanchelskis e o francês Eric Cantona se juntaram ao lendário goleiro dinamarquês Peter Schmeichel para fazer história naquela temporada. O fato é muito compreensivo, uma vez que a abertura do futebol inglês aos jogadores estrangeiros estava apenas começando. Nas próximas temporadas, essa situação mudaria de forma drástica.
Em 1993/1994, o United conquistou o bicampeonato com praticamente a mesma base do título anterior. De adição estrangeira – se é que podemos classificar assim – teve apenas o irlandês Roy Keane, que saiu do Nottingham Forest e faria mais de 300 jogos com a camisa dos Red Devils.
Blackburn Rovers – 1994/1995
Na temporada seguinte, o Blackburn Rovers surpreendeu a todos e interrompeu a série positiva do United, que seria retomada logo depois. O elenco vencedor, que era comandado pelo ídolo do Liverpool Kenny Dalglish, contava com cinco jogadores não-britânicos. Dentre eles, podemos considerar apenas dois que tiveram participação efetiva na campanha triunfal.
Foram eles: o defensor norueguês Henning Berg (40 jogos) e o meio-campista australiano Robbie Slater (18). O zagueiro irlandês Jeff Kenna jogou nove partidas na temporada. O defensor holandês Richard Witschge e o goleiro Shay Given – na época um jovem recém-promovido da base – passaram despercebidos.
Esse seria o último título de liga conquistado pelo clube desde então. Atualmente, os Rovers disputam a segunda divisão inglesa.
Leia mais: A histórica tríplice coroa do Manchester United em 1998/99
Manchester United 1995/1996
Voltamos ao time vermelho da cidade de Manchester, que conquistou mais um título da PL em 1995/1996. Alex Ferguson se desfez de alguns jogadores experientes (entre eles o russo Andrei Kanchelskis) e adicionou mais juventude local com David Beckham, Paul Scholes e os irmãos Neville (Phil e Gary).
O elenco vencedor deteve desta vez cinco atletas não-britânicos. O zagueiro francês William Prunier se juntou aos já campeões em temporadas anteriores Peter Schmeichel, Denis Irwin, Eric Cantona e Roy Keane.
O curioso é que Prunier atuou em apenas duas partidas naquela temporada e é considerado um dos piores jogadores que já passaram pelo Old Trafford.
Manchester United 1996/1997
Em 1996/1997, começou a ascensão de jogadores estrangeiros sendo contratados pelos clubes da Premier League. Foi talvez o primeiro boom dessa tendência. O United conquistou mais uma vez o título da liga e fez seis contratações para aquela temporada: cinco delas estrangeiras.
Os noruegueses Ronny Johnsen e Ole Gunnar Solskjaer desembarcaram na Inglaterra junto com o holandês Jordi Cruyff e o polonês Karel Poborsky. O goleiro holandês Raimond van der Gouw completou a lista.
Eles se juntaram a Peter Schmeichel, Denis Irwin, Eric Cantona e Roy Keane para a campanha do segundo campeonato consecutivo. Foram nove jogadores não-britânicos no elenco, sete deles fazendo mais de 10 partidas na liga.
Um fato que dificilmente se repetirá
Na mesma temporada que o United se sagrou campeão inglês, o Arsenal anunciava o francês Arsène Wenger como treinador. O clube viveria uma nova era, com títulos importantes e muitas contratações de jogadores estrangeiros – especialmente de nacionalidade francesa.
Em 1997/1998, os Gunners conquistaram o título inglês com cinco franceses no elenco: 11 jogadores não-britânicos no total. Na temporada seguinte, o Manchester United levantou mais um troféu, desta vez com cinco novas contratações estrangeiras.
Chegando nos anos 2000, mais um bicampeonato do time vermelho. Desta vez com 16 jogadores não-britânicos no plantel. A partir de então, é desnecessário seguir detalhando time por time para entender que a Premier League entrou de vez no período de globalização.
Finalizamos essa questão com uma pequena amostra a título de comparação: o primeiro campeão da Premier League conquistou a taça com apenas quatro não-britânicos enquanto o último campeão utilizou até aqui 16 jogadores estrangeiros.
O que se vê nos últimos anos são elencos cada vez mais estrangeiros e menos “caseiros”. Apesar da Inglaterra viver uma era de ouro no sentido de revelar jogadores, é praticamente impossível considerar que os times abdiquem de tantas contratações vindas de fora para apostar totalmente no produto da casa.
A Premier League é considerada a melhor liga do mundo, com altos orçamentos até para os clubes pequenos e grandes salários aos jogadores. Quase todo atleta estrangeiro sonha em jogar nos gramados ingleses.
Por essas e outras, cenas como a que o Burnley protagonizou se tornarão cada vez mais escassas.