Quem acompanha o futebol europeu já está acostumado com a equipe do Real Madrid contratando nomes de peso para reforçar o seu elenco a cada janela de transferências.
E a partir dos anos 2000, o Manchester United acabou sendo um dos principais alvos da equipe espanhola na busca por reforços.
O primeiro a trocar o vermelho de Manchester pelo branco de Madrid foi o astro inglês David Beckham, que em 2003 — após doze anos nos Red Devils — se juntou a Zinedine Zidane, Luis Figo e o brasileiro Ronaldo, formando a equipe conhecida como “galácticos”.
Três anos depois, foi a vez do atacante Ruud van Nistelrooy. O holandês chegou ao Old Trafford em 2001 e, cinco temporadas, 219 partidas e 150 gols marcados depois, rumou à equipe espanhola.
Sem o destaque dos citados anteriormente, tivemos ainda o lateral argentino Gabriel Heinze e o atacante mexicano Javier “Chicharito” Hernández.
E, claro, uma das maiores contratações da história do clube espanhol, quando trouxe o português Cristiano Ronaldo, que estava em plena ascensão em Old Trafford, e tornou-se uma lenda em Madrid.
Mas na década de 50, por pouco a equipe do Manchester United não contou com o maior jogador da história do Real Madrid em seu elenco: o argentino Alfredo Di Stéfano.
Santiago Bernabéu e Matt Busby: o início de uma grande amizade
Tudo começou com a boa relação construída entre o então presidente do clube espanhol, Santiago Bernabéu, e o comandante da equipe dos Red Devils, Matt Busby.
Busby chegou ao Manchester United em 1945 e revolucionou o clube. Implantou uma filosofia onde priorizava a utilização de jogadores vindos da base, surgindo então a era dos “Busby Babes” em Old Trafford.
Foi então que em 1957, Busby e o United enfrentaram o Real Madrid, do então presidente Santiago Bernabéu, em partidas válidas pela semifinal da Copa da Europa – atual UEFA Champions League.
Mas a jovem equipe inglesa não conseguiu segurar os espanhóis, e após terem sido derrotados na partida de ida, fora de casa, por 3 a 1. No jogo da volta em Old Trafford os times acabaram empatando em 2 a 2.
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Apesar da eliminação, Bernabéu se mostrou impressionado com o ótimo trabalho realizado por Busby.
E tamanha foi sua admiração, que o presidente dos Merengues chegou a oferecer a Busby uma oportunidade para trabalhar no Real Madrid.
A proposta acabou sendo recusada pelo escocês, que demonstrou querer dar continuidade com o seu trabalho e conquistar a Europa com o Manchester United. Mas apesar da recusa, a relação entre os dois acabou se estreitando.
Rivalidade somente dentro das quatro linhas
Veio então o fatídico 6 de fevereiro de 1958, dia em que ocorreu a tragédia de Munique. Após vencer a equipe do Estrela Vermelha em Belgrado, o avião que levava o Manchester United de volta para a Inglaterra caiu após tentativa de decolagem em Munique.
No total, 23 pessoas morreram nessa fatalidade. Entre eles oito jovens jogadores que faziam parte dos “Busby babes”.
E após esse trágico acidente, Santiago Bernabéu e o Real Madrid realizaram diversas ações mostrando toda a sua solidariedade com o clube inglês.
O autor John Ludden escreveu em seu livro “Um Conto de Duas Cidades: Manchester e Madri 1957 – 1968”: “Quando você olha para trás na história e vê o que o Real Madrid fez pelo Manchester depois de Munique… é incrível.”
Os Merengues ofereceram sem nenhum custo as instalações do clube para a recuperação dos feridos envolvidos no desastre.
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Apesar de terem remontado o time após a tragédia, compreensivelmente o Manchester United acabou sendo eliminado pelo Milan nas semifinais da Copa da Europa.
Na final, o Real Madrid acabou derrotando os italianos. O espanhol então dedicou a conquista ao United – chegando também a oferecer o troféu da competição, mas isso acabou sendo recusado pelos ingleses.
Di Stéfano com um pé no United
Pensando em ajudar na remontagem do time inglês, Bernabéu chamou Alfredo Di Stéfano para conversar. O motivo: o mandatário espanhol gostaria de emprestá-lo ao Manchester United.
De acordo com Ludden: “Bernabéu foi ver Di Stéfano sobre isso. Ele (Di Stéfano) estava disposto a ir até o final da temporada, com o Manchester United pagando metade do seu salário e o Real Madrid a outra metade”.
Com tudo acertado entre os clubes e o jogador, surge então o grande vilão que impossibilitou que o maior jogador da história merengue vestisse a camisa dos Red Devils: a Football Association (Federação Inglesa).
A entidade que comanda o futebol inglês alegou que Di Stéfano poderia tomar o lugar de um potencial jogador britânico, vetando assim a transferência.
Com a proibição da FA, Santiago Bernabéu buscou outras formas em ajudar o Manchester United e seu amigo, Busby.
Procurando alternativas para ajudar na arrecadação de fundos para que o time inglês pudesse também se reerguer financeiramente, os espanhóis produziram flâmulas com os nomes das vitimas do acidente. Chamou-os de “Campeões de Honra”, e com as suas vendas sendo realizadas na Espanha.
Outra atitude tomada por Bernabéu e o Real Madrid foi a realização de uma série de amistosos entre os dois times.
A reconstrução dos Red Devils
Matt Busby seguiu no comando do Manchester United. Participou de todo o processo de reconstrução do clube, mas seguindo sua metodologia de utilização de jovens jogadores.
E no dia 29 de maio 1968, dez anos após a tragédia de Munique, os “Busby Babes” derrotaram o Benfica e conquistaram o título da Copa da Europa.
Esse foi o primeiro título de âmbito europeu da história do clube, fazendo com que Busby alcançasse o objetivo que o fez recusar a proposta de Bernabéu: conquistar a Europa comandando o Manchester United.
E, por coincidências que só o futebol proporciona, para chegarem a final os ingleses acabaram derrotando justamente o Real Madrid.
Após vencerem a primeira partida em Old Trafford por 1 a 0, gol de George Best, a equipe buscou heroicamente a classificação para a final na Espanha, buscando o empate em 3 a 3 depois de estarem perdendo por 3 a 1.
Apesar da desclassificação, Santiago Bernabéu disse que “se tivesse que ser qualquer um, então fico feliz que foram eles”.
Após perceber que os espanhóis tiveram um papel importante na reconstrução do clube inglês, é impossível não concordar com Ludden: é realmente incrível.