Um pouco mais de 20 anos atrás, eu escrevi na BBC que o Santos superando Corinthians — que naquela época não tinha Libertadores ainda — foi, uma façanha incrível, e que seria, em termos ingleses, como o Brighton superando o Arsenal.
Um sujeito na assessoria de imprensa do Santos ficou revoltado. Como pode, beirou, cometer a ousadia de comparar o grande e imortal Santos com um clubinho na terceira divisão da Inglaterra?
Podemos pegar leve. Pode ser que o elemento não estava nos seus melhores dias. Ou podemos combinar que era burrice mesmo — porque ele não foi capaz de reconhecer um elogio.
Na ordem natural das coisas, um time representando uma cidade com menos de meio milhão de habitantes vai ficar na sombra do clube mais popular da maior cidade do continente, que por sinal fica perto. Tanto que não tem outro Santos no Brasil, outro clube fora das grandes capitais com uma história nem perto, muito menos parecida. Vamos além — não tem nem nas grandes cidades do Brasil um clube que até agora conseguiu a projeção global que Pelé e companhia proporcionaram ao Santos.
Santos e Brighton: soluções diferentes para problema parecido
Claro, tem uma grande dose de “outros tempos, outros tempos”. Nas últimas décadas, as distâncias financeiras abriram. Ficou mais difícil um clube de uma cidade relativamente pequena competir com os gigantes. Neste século, o Santos — mais uma vez de uma forma maravilhosa — achou um caminho: investir na base. Mas trata-se de um modelo que normalmente tem prazo.
Porque sempre tem que substituir os talentos vendidos e chega um momento em que a próxima geração não está pronta ou boa o suficiente. Sem grandes investimentos, o futuro do Santos preocupa.
E o Brighton? Bem, nunca vai ser o Santos do Pelé.
Mas nos últimos anos cresceu bastante — tanto que, hoje em dia, talvez nosso conhecido na assessoria de imprensa não fique tão revoltado com a comparação.
Como o Peixe, trata-se de um clube interessante de uma cidade bem simpática — Brighton é tipo uma “Londres no litoral”. Ultimamente o clube se transformou no segundo time de muita gente, usando bastante inteligência para tal.
Uma lei geral — se você é menor, tem que ser mais esperto. Tem que achar um diferencial.
Se o Santos fez isso produzindo jogadores, Brighton o conseguiu contratando-os, buscando em lugares onde outros não estavam olhando.
Houve uma resistência geral em comprar diretamente da América do Sul. Nem aí, o Brighton foi para o Equador e levou Moisés Caicedo por um preço absurdo de baixo. Foi para a Argentina e levou Alexis MacAllister. Primeiro os dois foram sensacionais no campo. Depois, foram também para as finanças do clube. Brighton vendeu MacAllister para Liverpool e Caicedo para Chelsea e ficou com um lucro extraordinário.
Mas agora vem o desafio. Na verdade, vem um desafio duplo. Primeiro, tem que substituir esses jogadores — tarefa difícil, embora a contratação de Ansu Fati mostre uma capacidade interessante de atrair talento. Segundo, tem que lidar com rivais que não vão mais subestimar o Brighton, que tem estudado bastante a sua forma de jogar.
Porque nunca foi um caso de simplesmente comprar bons nomes e entregar uma camisa para eles. Tem também uma ideia de jogo, bolada de uma forma brilhante pelo técnico Roberto De Zerbi.
O Brighton gosta de atrair o rival para pressionar alto. Aí os seus meio-campistas são bem treinados para vencer a pressão e lançar o que podemos chamar de uma transição falsa — uma transição criada pelo próprio Brighton. E o espaço abre na frente, para ser aproveitado principalmente pelo japonês Mitoma.

Mas se o adversário não lê o enredo? Um bom exemplo foi em maio passado, quando o Everton — o time naquele momento com menos gols na Premier League — venceu o Brighton fora por 5 a 1. O Everton não caiu na armadilha. Não foi lá para pressionar. Ficou esperando no seu campo. Aconteceu de novo na última rodada, quando o Brighton perdeu por 3 a 1 contra um West Ham que ficou com somente 22% da posse da bola.
No sábado, o time tem que responder a uma outra pergunta quando joga contra o Newcastle. Pela primeira vez na temporada enfrenta um adversário bem poderoso. Já sem Caicedo e MacAllister, o Brighton vai conseguir penetrar a pressão de um time forte que vem mordido depois de uma derrota dolorosa?
Não é fácil ter — e manter — um golpe muito mais poderoso que seu peso. O Santos teve durante muito tempo, mas agora se acha contra as cordas. O Brighton vem encarando os pesos pesados. Mas até quando?