Fico muito triste ao constatar que Alisson é o perseguido da vez. Inexplicavelmente virou um dos vilões da eliminação do Brasil na Copa do Mundo, como se ela fosse produto de um, e não do todo. Aconteceu com Fernandinho, Felipe Melo e Julio César, Roberto Carlos… E, infelizmente, acontecerá sempre que não vencermos (a maioria das vezes). Faz parte da cultura tóxica que permeia o futebol brasileiro.
Mas nessa eu não me dou por vencido.
Desde a partida contra a Croácia as críticas são desproporcionais. Alisson está com 30 anos, foi titular da seleção brasileira em dois ciclos e naturalmente fará parte do terceiro, pois ainda agarra em altíssimo nível. Mas o que se vê por aí é uma rejeição inexplicável (pedindo permissão para repetir a expressão) de parte dos analistas, que supostamente deveriam acompanhá-lo com afinco, afinal, joga na Premier League, e torcedores em geral.
No domingo, Alisson fez uma defesa espetacular contra o Newcastle no chute de Almirón. O lance ficou ainda mais especial com a virada do Liverpool nos minutos finais, mesmo com um a menos (naquele momento, perdia por 1 a 0). Ao contrário de Eddie Howe, técnico do Newcastle, eu não acho que tenha sido a mais difícil ou impactante dele, mas viralizou.
Alisson: atacado no Brasil, louvado na Inglaterra
O amigo Eduardo Barthem fez um belo trabalho de comparar as reações nos comentários das postagens do perfil oficial do Liverpool e também da ESPN Brasil. De um lado, elogios à defesa e ao atleta. Do outro, críticas, pois é assim que muitos parecem se relacionar com o futebol, através da toxicidade. Não é mais possível usufruir da beleza do jogo e suas nuances.
Obviamente, Alisson não é uma novidade para os ingleses. Ele está no Liverpool desde a temporada 2018/19, já conquistou Liga dos Campeões (e foi finalista outra vez) e Premier League, tem enorme moral com a mídia e torcedores. É de uma senhora regularidade.
Ao ponto de, na segunda-feira, o perfil da ESPN UK no Twitter ter feito um post propondo um desafio aos seguidores: escalar um, bancar outro e dispensar um terceiro entre Alisson, Petr Cech e Peter Schmeichel. Veja só o patamar do brasileiro…
E aí outro amigo, Vinícius Fernandes, definiu bem a situação com um tweet irônico-espirituoso que merece a menção por aqui. Enquanto lá se discute a grandeza de Alisson, aqui ainda perguntam se o Cássio (que é uma entidade, diga-se) teria defendido o chute do De Bruyne (ou o do Petkovic, com desvio)…
E isso, convenhamos, é de certa maneira um desprezo à carreira dele. Exatamente como aconteceu com Fernandinho, titular do Manchester City durante anos, multicampeão, adorado por ninguém menos que Pep Guardiola, e desrespeitado em muitas rodas de debate no Brasil.
Pois Alisson está em sua sexta temporada como titular incontestável do Liverpool, e antes já brilhava pela Roma. Foi para a seleção por méritos, lá se manteve por méritos e, mesmo com a ótima temporada do Ederson, não há um terceiro goleiro brasileiro como ele.
Alisson foi goleiro com mais gols evitados na Premier League 2022/2023
Fui ao site FBREF para buscar estatísticas que pudessem atestar o seu alto nível de desempenho. Para quem está familiarizado com a métrica xG (gols esperados, em inglês), existe algo muito parecido para goleiros.
É o que chamam de PSxG (gols esperados após a finalização) menos a quantidade de gols sofridos. Ao longo de todo campeonato, Alisson foi o melhor goleiro em todo o quesito na temporada 2022/23. Foram 10 gols evitados de acordo com a qualidade das finalizações dos adversários. Se o Liverpool já terminou em quinto com ele, imagine sem…
Nesta mesma métrica, Ederson foi o 32º, com -4,8 gols negativos (ou seja, levou quase cinco gols a mais do que deveria de acordo com a qualidade das finalizações dos adversários).
E na seleção brasileira? E na Copa do Mundo?
“Ah, mas na seleção é outra coisa”. Bem, a começar pelo sistema defensivo. A bola chegava muito menos ao gol do Brasil, que na Copa do Mundo do Catar teve apenas 1,9 gol sofrido esperado enquanto Alisson esteve em campo.
Ele sofreu dois, um contra a Croácia e outro contra a Coreia do Sul, jogo em que fez duas defesaças, mas pouco lembradas, pois o ataque funcionou e marcou quatro vezes. Nas quartas de final os gols perdidos fizeram falta.

Na Copa de 2018 aconteceu basicamente o mesmo, novamente com a defesa brasileira concedendo poucas oportunidades e Alisson sem culpa nos gols sofridos (um da Suíça e os dois da Bélgica).
Você pode olhar para tudo isso e contestar se a fama pelo Liverpool foi fruto de uma só temporada. Bem, fiz questão de pesquisar desde a chegada de Alisson à Premier League. Apenas uma edição foi fora da curva em termos de desempenho, justamente a que o Liverpool foi campeão.
A título de comparação, no geral, desde 2018/19, Alisson tem um saldo positivo de 17,4 gols. No mesmo período, Ederson tem um saldo negativo de 0,6 gol.
E ninguém fala o mesmo do Ederson, certo?
Até porque também é um ótimo goleiro e vem de grandes atuações na Liga dos Campeões…
Pra mim está muito claro que Alisson é um excelente goleiro, algo que pude comprovar já no primeiro ano de Liverpool. Caso você ainda não acredite nisso, procure o que Jürgen Klopp tem a dizer sobre ele.
E se a sua régua for única e exclusivamente o desempenho em Copas do Mundo, também não há o que contestar. Ali Alisson pode não ter sido brilhante como de costume, mas está muito longe de ser o responsável por qualquer eliminação.
E simplesmente não há brasileiro melhor do que ele.