Já faz um tempo em que considero a Premier League a melhor competição nacional de clubes do mundo. Mas de uns tempos para cá fui tomado por uma ansiedade eterna entre maio e agosto. Sou um torcedor do Arsenal confesso, mas sobretudo um apaixonado pela liga, clubes, rivalidades, atmosfera – e até o Fantasy eu participo porque apenas assistir aos jogos não é suficiente.
Pois está começando mais uma temporada e hoje é fácil entender por que a Premier League, ou a nossa PL, é tão especial.
Posso começar escrevendo sobre os gramados, geralmente mais verdes do que dos vizinhos. São impecáveis, e nem preciso citar o jardineiro do Leicester (você já deve ter visto alguma referência por aí nas redes sociais). A bola rola sem fazer esforço, a não ser que esteja em época de neve. Isso contribui fortemente para o espetáculo, e nós aqui do Brasil sabemos bem disso da pior maneira.
Os estádios geralmente estão lotados. E praticamente todos são estádios propriamente, e não arenas de Copa do Mundo. As torcidas ficam próximas do campo e criam um ambiente que gera um mínimo interesse independentemente se o jogo está sendo bom ou ruim.
Na última temporada foram sete clubes com média superior a 50 mil torcedores por jogo. E é possível dizer que esse número só não foi maior por conta da capacidade dos demais estádios (Bournemouth e Brentford, por exemplo, jogam para menos de 20 mil, mas certamente não é fácil conseguir um ingresso).
Considero outro fator externo bastante influente: as transmissões. Há um enorme cuidado com o produto, as imagens, a quantidade de câmeras, a tecnologia, o pacote gráfico, a abertura, a fonte da camisa… enfim, a embalagem que chega para qualquer fã ao redor do mundo. No Brasil, a ESPN faz um excelente trabalho há décadas, também entrevistando grandes personagens com alguma frequência (podem ter certeza que essa é uma estratégia da liga).
Ter grandes craques ajuda? Certamente. Mas a Premier League não é exatamente famosa por ter os melhores jogadores do mundo. Pelo menos não os vencedores dos prêmios. O último foi Cristiano Ronaldo, em 2008, quando ainda era um ponta goleador no Manchester United.
Agora, façam um exercício de imaginar os 50 melhores jogadores do mundo na atualidade. Eu tenho certeza que a Premier League terá larga vantagem, pois é uma liga de marcas. O Manchester City, o Liverpool, o Chelsea, o Manchester United, o Arsenal, o Tottenham… O “Big Six” que, na prática, já está aberto a outros projetos como Newcastle, Brighton, Aston Villa… Cada um com a sua história e particularidade.
Na verdade, eu poderia citar praticamente a liga inteira. Dos 30 maiores faturamentos do mundo, segundo estudo anual da Deloitte, 16 são de ingleses. O West Ham tem receita superior ao Milan, o Brighton se equipara ao Benfica, o Crystal Palace é mais rico que Ajax, Sevilla e Villarreal.
No longo prazo, essa diferença é bastante perceptível no mercado de transferências. No momento em que escrevo este texto, a Premier League gastou praticamente o mesmo do que as outras top-5 ligas somadas. É comum olhar para qualquer elenco de meio de tabela na Inglaterra e ver um destaque de outra liga.
Os melhores técnicos também estão lá. Guardiola, Klopp, Ten Hag, Arteta… Antes Thomas Tuchel, Mourinho, Conte. Isso, claro, agrega qualidade.
Nas competições europeias, os ingleses enfim começaram a abrir suas asinhas. O West Ham é o atual campeão da Conference League. O Manchester City enfim conquistou a sua Liga dos Campeões depois de ter sido vice para o Chelsea em 2021. O Liverpool ganhou em 2019, contra o Tottenham (e foi finalista em 2018 e 2022).
O Manchester United foi campeão da Liga Europa em 2017 e vice em 2021. O mesmo Chelsea venceu a Liga Europa em 2019, sobre o Arsenal. E o fato de como isso tornou-se possível também é enriquecedor.
A PL passa a impressão de ser uma marca tão forte quanto a NBA, embora estejamos falando do esporte mais popular do mundo. No futebol, há concorrência em todo o lugar.
E ela conseguiu esse status tratando muito bem do que é seu. Mas fomentando o todo, e não as partes. A Premier League enxergou que o caminho para o sucesso passava pela divisão do seu dinheiro.
- 50% são divididos igualitariamente por todos os clubes
- 25% vão de acordo com o mérito esportivo, no caso, a posição na tabela
- 25% são organizados segundo o número de transmissões nacionais
Para este ano, ainda houve uma divisão do mérito esportivo para os direitos internacionais, uma forma de agradar as grandes marcas que atraem torcedores na China, Índia, África…
De qualquer maneira, a diferença entre Manchester City e Southampton, nas duas pontas da tabela em 2022/23, deverá ser de aproximadamente 1,60x. No Brasil, o acordo está na casa de 3,5x.
É importante ressaltar que isso está longe de determinar as posições finais no campeonato. Os clubes gigantes seguirão faturando mais em outras linhas, como comercial/marketing/bilheteria, e poderão reforçar melhor os seus times. É o que tem acontecido na prática.
Continua sendo muito raro ver um intruso no G4, como o Newcastle (embora já tenha investimentos compatíveis). Ou uma campanha bastante surpreendente como a do Brighton, que faz um excelente trabalho de prospecção.
A regra é termos os mesmos se revezando por ali, mas nem por isso a Premier League deixa de ser interessante. Pelo contrário.
Como eu vou discordar disso tudo? Vamos para mais uma temporada!