Por que o cachecol ‘meio a meio’ é odiado na Inglaterra

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A Premier League volta em agosto. E nas arquibancadas, milhares de torcedores estarão vestindo as cores e camisas de seus clubes, com mangas curtas, enquanto o verão europeu ainda permite.

Cena rara na Inglaterra, uma vez que na maior parte do ano o que se vê na torcida são adultos e crianças com seus casacos escuros, gorros e cachecóis para se protegerem do frio.

Alguns especificamente, vestem uma peça que gera muita discórdia entre os ingleses: o cachecol meio a meio, com as cores dos do mandante e do visitante. 

Por aqui na Inglaterra, o acessório é conhecido como “Half-and-half scarf” (cachecol meio a meio, em português) ou “matchday scarf” (cachecol do jogo do dia). Quando se vai a um jogo da Premier League, é inevitável não se deparar com barracas e ambulantes que vendem o acessório. Tem para todo o gosto: o tradicional com as cores do clube da casa, com o rosto do treinador, dos jogadores e o polêmico meio a meio.

Não importa o tamanho da rivalidade. É possível encontrar até mesmo cachecóis com as mesmas cores e distintivos de clubes com rivalidade acirrada: Arsenal e Tottenham, Liverpool e Everton, City e United. Tentamos até pesquisar se existe um cachecol de West Ham e Millwall, mas não encontramos registros.

Torcedor do United com o polêmico cachecol meio a meio (Foto: Icon Sport)

Quem é “local”, ou seja, quem é da Inglaterra, não compra os cachecóis meio a meio pois esse é um item que causa bastante indignação entre eles. Quem gosta de comprar são turistas, como uma lembrança de que estiveram no jogo. Viajar nem sempre é fácil ou barato, então eles querem uma recordação.

Graham Anderson, vendedor que trabalha nos arredores do Goodison Park para a BBC Sport

Uma enquete realizada em 2023 no perfil do X da revista britânica “FourFourTwo” resultou em 91,6% dos votos contra os cachecóis meio a meio.

Isso faz com que as pessoas pareçam consumidores, o oposto de como os torcedores gostam de pensar sobre si mesmos. A maioria dos torcedores acredita que torcer é uma consequência do nascimento. Onde você nasceu ou a influência de um pai o conecta a um clube específico. Não importa se a fase do time é ruim, você não pode se livrar disso

John Williams, especialista em sociologia do futebol da Universidade de Leicester para a BBC Trending.
Cachecol com rosto estampado de jogadores e treinadores também faz sucesso entre torcedores (Foto: Icon Sport)

Ambulantes no Stamford Bridge

Em 2016, o Chelsea declarou guerra ao cachecol meio a meio. O clube conquistou o direito de registrar a palavra “Chelsea” em todas as peças de vestuário, podendo reprimir mercadorias não oficiais vendidas fora do estádio em dias de jogos.

Mas na prática isso não funciona. Vendedores não licenciados faturam do lado de fora do Stamford Bridge cobrando até 30 libras (R$ 215) por cachecol.

De acordo com a Trading Standard, um órgão legislador do comércio no Reino Unido, os produtos são de qualidade duvidosa, com nomes de times mal escritos e logotipos de marcas registradas.

Ambulante vendendo o meio a meio em frente ao estádio Molineux (Foto: Icon Sport)

Além disso, esses vendedores ilegais prejudicam e geram revolta entre os comerciantes licenciados, que pagam cerca de mil libras por ano para poderem ter suas barracas ao lado do estádio do Chelsea.

Alguns dos comerciantes legalizados, que ganham até 7,5 mil libras vendendo mercadorias em apenas três horas em dias de jogos, chegam até mesmo a serem hostilizados ataques por vendedores dos produtos “piratas”.

Para tentar resolver o problema, a polícia faz rondas frequentes nos arredores do estádio dos Blues. 

Recentemente, um comerciante não licenciado foi multado em 14 mil libras por vender cachecóis e por cometer delitos em diferentes localidades.  Outro foi solicitado a pagar mais de 2,3 mil libras pela venda de cachecol no Craven Cottage e no Stamford Bridge.

Rodolfo Morsoletto
Rodolfo Morsoletto

Jornalista formado pela Unimep com passagens por Terra e OneFootball. Foi repórter de rádio, setorista do XV de Piracicaba e cobria jogos do Campeonato Paulista da Série A3. Está em Londres desde 2018 onde atualmente é correspondente da PL Brasil. Já tietou José Mourinho andando aleatoriamente pelas ruas da capital britânica.

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