Muito antes do título do Leicester, em 2018, a Premier League já teve sua primeira grande zebra. Foi na temporada 1994/1995, e o campeão foi o Blackburn Rovers.
Todo admirador de futebol britânico sabe que a Inglaterra está cheia de clubes tradicionais, com grandes histórias, torcidas, personagens e até mesmo conquistas, mas que na era da Premier League (a partir da temporada 1992/1993) não conseguiram acompanhar os passos de gigantes, como Manchester United e Arsenal. O Blackburn Rovers é um desses casos.
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Fundado em 1875, na cidade de Blackburn, em Lancashire, norte inglês, o clube foi um dos grandes conquistadores de taças no final do século 19 e início do século 20. Foram cinco títulos da FA Cup, entre 1884 e 1891, e mais um em 1921, além de dois canecos da Division One (antiga primeira divisão), em 1912 e 1914.
Após esse período de glórias o clube deu uma estagnada. Aliás, alternou temporadas na elite com anos pela segunda, e até terceira, divisão, ficando longe das conquistas. Isso até a mágica temporada de 1994/1995.
O título da Premier League foi uma surpresa, mas também, de certa forma, uma construção. Posto que os Rovers haviam sido vice-campeões na temporada anterior e haviam chegado à quarta posição dois anos antes.
O torcedor milionário do Blackburn
A história daquela conquista passa por jogadores como Chris Sutton, Tim Sherwood e o grande Alan Shearer, além do técnico Kenny Dalglish. Mas é impossível contá-la sem começar por um homem fora do campo: Jack Walker.
Walker era um homem multimilionário, industrial do setor metalúrgico, e fanático torcedor do Blackburn Rovers. Em 1988, ele decidiu usar parte de seu dinheiro para auxiliar seu clube de coração. Além disso, até doou materiais de construção para a reforma do estádio Ewood Park.
A partir daí, o empresário manteve-se envolvido com o clube, até assumir seu controle em 1991. Anos antes da chegada de Roman Abramovich ao Chelsea, o estilo de administração de Walker (injetando sua própria fortuna na contratação de atletas) era algo incomum no futebol inglês.
Com o clube na segunda divisão, a primeira grande ação de Walker foi convencer o supercampeão Kenny Dalglish a assumir o cargo de técnico. O Blackburn conquistou vaga para a temporada inaugural da Premier League (1992/1993).
O empresário então gastou cerca de 25 milhões de libras em contratações (uma cifra astronômica para a época). Ele quebrou duas vezes o recorde de transferências domésticas.
Primeiro ao pagar 3,6 milhões de libras para tirar Alan Shearer do Southampton, em 1993. E depois, em 1994, ao contratar Chris Sutton, do Norwich, por 5 milhões de libras.
Os investimentos pesados deram resultado. Em sua primeira Premier League, os Rovers conseguiram um excelente quarto lugar, ficando 13 pontos atrás do campeão Manchester United.
No ano seguinte, uma campanha ainda melhor levou o clube ao vice-campeonato, dessa vez oito pontos a menos dos que os vencedores (mais uma vez o United).
O início de uma grande campanha
A pergunta no início da temporada 1994/1995 era se alguém poderia impedir o tricampeonato do United. Inesperadamente, o Blackburn apresentou-se como candidato para a tarefa desde o início.
Dalglish montou um time agressivo, que atuava para levar a bola até a incrível dupla formada por Shearer e Sutton (que ficou conhecida como SAS). Juntos os dois marcaram impressionantes 49 gols naquele campeonato.
O início da campanha foi empolgante, com cinco vitórias nos primeiros sete jogos. A primeira derrota veio na oitava rodada, 2 a 1 para o Norwich. A equipe respondeu bem com uma bela vitória de 3 a 2 contra o Liverpool.
Os meses de novembro e dezembro foram fundamentais para a conquista. Naquele período, os Rovers jogaram dez partidas, tendo vencido nove e empatado uma.
Outros fatores importantes, segundo as análises esportivas da época, foram três eliminações. Na Copa da Liga, para o Liverpool, na FA Cup, para o Newcastle, e na Copa da Uefa, para o Trelleborg, da Suécia. Ou seja, isso permitiu ao time focar todas as forças na disputa da Premier League.
Sem dúvida, a equipe estava firme no topo da tabela, mas era necessário manter o pique, pois o Manchester United, de Eric Cantona, também mostrava uma performance forte. Os Red Devils derrotaram os Rovers tanto no turno quanto no returno.
A reta final foi complicada para o Blackburn, com algumas derrotas inesperadas, como para o Manchester City, em casa, e para o West Ham, em Londres. Muitos, na época, avaliavam que o time estava com dificuldades para manter os nervos no lugar.
Emoção na rodada final
Uma vitória, em casa, de 1 a 0 contra o Newcastle possibilitou aos comandados de Dalglish irem para a última rodada com dois pontos de vantagem sobre o United. O adversário seria o Liverpool, em Anfield. Ao mesmo tempo, os Red Devils estariam jogando contra o West Ham, em Londres.
Um gol logo cedo de Shearer, aliado à notícia de que os Hammers faziam 1 a 0 na outra partida, deu a impressão de que a tarde seria tranquila para os Rovers.
Mas o Liverpool começou a jogar melhor e John Barnes empatou o jogo. Logo veio a notícia de que o Manchester United também havia conseguido seu empate, com Brian McClair.
Tudo ficou mais tenso quando Jamie Redknapp colocou o Liverpool na frente. Era isso. O Manchester United precisava de um gol para ser tricampeão da Premier League.
Até hoje, e provavelmente para sempre, os torcedores do Blackburn Rovers agradecem ao goleiro Ludek Miklosko, do West Ham, por ter feito algumas defesas muito importantes naquele dia.
O placar não mudou em Liverpool e nem em Londres. O Blackburn Rovers era campeão da Premier League, com um ponto de vantagem sobre o poderoso Manchester United.
Enfim, festa de Kenny Dalglish e de seus atletas. Festa de Jack Walker, que realizava um sonho de criança ao ver seu clube campeão inglês.
Marcados na história
A campanha dos campeões de 1994/1995 foi de 89 pontos em 42 jogos. Foram 27 vitórias, oito empates e sete derrotas. Saldo de gols de 41, sendo 80 marcados e 39 sofridos.
Alan Shearer foi o artilheiro com 34 gols, além de ter sido eleito o melhor jogador da temporada, enquanto Dalglish foi eleito o melhor técnico.
Posteriormente ao título, Dalglish foi promovido a diretor do clube, que nunca mais chegou perto de repetir a mesma façanha. Jack Walker manteve-se no poder até o ano 2000, quando faleceu.
Na atual temporada, o Blackburn Rovers disputa a Championship, buscando estar novamente na Premier League para, quem sabe, trazer novas sensações de felicidade para os torcedores em Ewood Park.
A torcida do Oasis
Todos sabem que os irmãos Liam e Noel Gallagher, da banda Oasis, são torcedores fanáticos do Manchester City. Da formação original do grupo, o baixista Guigsy também é um Blue.
O que poucos sabem é que um outro membro fundador da banda, o guitarrista Bonehead, é torcedor do Manchester United, ou um “dirty red”, como Noel costumava chama-lo.
No dia em que a Premier League de 1994/1995 estava sendo decidida, o Oasis estava em um estúdio no interior do País de Gales gravando o que seria seu disco de maior sucesso, o (What’s the Story) Morning Glory?.
Enquanto gravava os vocais para o que seria o hit Champagne Supernova, Liam Gallagher apressava o produtor Owen Morris para que terminasse a sessão, pois ele precisava ir ver o “United perdendo a liga”.
Liam vai para uma sala onde todos acompanham os momentos finais da rodada. Bonehead, tenso, torce para o gol do título dos Red Devils, enquanto seus colegas querem que tudo fique como está.
Apito final e Blackburn campeão. Bonehead é atacado por objetos enquanto seus companheiros festejam e cantam o nome de Dalglish. Para vingar-se, o único torcedor do United no Oasis pega um extintor de incêndio e parte para o ataque.
Essa cena hilária pode ser vista no documentário Supersonic, sobre o Oasis, disponível na Netflix.