Valores, timing e concorrência: Por que André não saiu para a Premier League nesta janela

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Por Diogo Magri e Guilherme Ramos

Não vai ser desta vez que André, um dos volantes mais promissores do futebol brasileiro, jogará na Premier League. A janela de janeiro se encerrou sem que o Fluminense topasse negociar seu talento de 22 anos, titular absoluto de Fernando Diniz e valorizado após ganhar a Libertadores.

A notícia é surpreendente porque existia a expectativa que ele fosse negociado em janeiro. André recebeu ofertas de Fulham, Liverpool e West Ham entre julho e agosto do ano passado. A maior dela foi dos Reds, que ofereceram 30 milhões de euros quando estavam atrás de novos meio-campistas.

Fluminense e André negaram as propostas, uma atitude que foi publicizada tanto pelo jogador quanto pelo presidente do clube, Mário Bittencourt.

A justificativa, na época, foi esportiva. Clube e atleta entenderam que valia a pena não perder André no meio do ano para ter mais condições de buscar o primeiro título sul-americano da história do Fluminense. Assim, o jogador poderia sair em janeiro, com a missão cumprida e ainda valorizado.

A aposta pela taça da Libertadores deu certo. O volante ainda jogou o Mundial de Clubes, no qual o Flu foi derrotado pelo Manchester City. Só que a saída não se concretizou no tempo esperado.

Por quê? A PL Brasil te explica.

Principal motivo é financeiro

O que explica o “fico” de André é o lado financeiro: não foi feita proposta em janeiro que chegasse no valor desejado pelo Fluminense. O clube se baliza pelo que foi oferecido pelo Liverpool em agosto — ou seja, só venderia por pelo menos 30 milhões de euros.

A PL Brasil ouviu do entorno do jogador que um clube da Premier League fez uma oferta de 20 milhões de euros, com mais 5 milhões de euros em metas alcançadas, na “reta final da janela”. O nome do time não foi revelado e o Fluminense não confirmou a informação.

De qualquer forma, o clube também tem certo poder de barganha. Isso porque a multa rescisória no contrato do jogador está na casa dos 80 milhões de euros.

Janela pouco movimentada na Premier League

O que também está por trás da “não-transferência” de André é o fato da janela de inverno na Europa estar ainda menos movimentada que o normal.

O período no meio da temporada europeia tradicionalmente faz circular pouco dinheiro, mas os negócios foram ainda mais afetados no início de 2024. Ficou clara a preocupação de muitos clubes em não deixar de cumprir as regras do fair play financeiro motivo que levou à punição do Everton, por exemplo –, que acarretou num mercado cauteloso para todos.

Tanto que, nesse contexto, uma possibilidade concreta que surgiu para André foi um empréstimo com obrigação de compra. Esse modelo funcionaria como um pagamento parcelado: o clube pagaria um valor menor em janeiro para contratar o jogador por empréstimo e, obrigatoriamente, fecharia a compra em definitiva por um valor maior, na próxima janela.

A PL Brasil apurou que o negócio chegou a ser a opção mais provável para André sair em janeiro. E uma negociação do tipo contaria com a aprovação tanto do staff do jogador quanto do clube.

O Atlético de Madrid foi quem sinalizou com uma proposta do tipo, em que pagaria 15 milhões de euros por um empréstimo de seis meses, somados a uma obrigação de compra de 35 milhões de euros — que seria executada em junho. O negócio totalizaria 50 milhões de euros (R$ 268 milhões).

No entanto, a oferta sequer chegou nas Laranjeiras. E André ficou.

Grealish parte para cima de André na final do Mundial (Foto: Icon sport)
Grealish parte para cima de André na final do Mundial (Foto: Icon sport)

André perdeu o ‘timing’?

Apesar de muito requisitado nos últimos meses, André pode ter “perdido o timing” para uma transferência para a Premier League. Isso porque o maior interesse veio na janela do meio do ano.

Com as recusas entre julho e agosto, é difícil imaginar que as equipes da Premier League esperariam janeiro para resolver seus problemas em campo. Foi o caso de Liverpool e West Ham, que se voltaram a outras opções de mercado e contrataram volantes.

A pressa do Liverpool

No caso dos Reds, a chegada de Wataru Endo, vindo do Stuttgart, foi uma adição muito mais pronta e experiente para um problema que estava prestes a desabrochar no meio-campo. É verdade que a contratação pegou muitos de surpresa pelo nome pouco conhecido e pela idade — um contrato de quatro anos para um jogador que completará 31 anos ainda em fevereiro.

No entanto, foi uma situação necessária para Jürgen Klopp, que decidiu não esperar o tempo do Fluminense para vender André e, ao mesmo tempo, precisava de alguém que desse conta do recado de maneira imediata.

Há nove anos na seleção japonesa, da qual é o atual capitão, Endo já tem 24 jogos com a camisa do Liverpool — 15 deles na Premier League –, e uma média de 53 minutos por jogo.

Avaliação técnica entrou em jogo

André também teve um porém no Liverpool. Apesar do interesse “de cima”, houve uma avaliação interna de que ele não estava preparado, principalmente fisicamente, para performar em alto nível na Premier League.

A PL Brasil adiantou essa avaliação técnica em novembro. O perfil do volante não é visto como o melhor para o modelo de jogo dos Reds. O encaixe do brasileiro na equipe e na liga de modo geral não seria o mais fácil, avaliou uma fonte envolvida nas tratativas à reportagem.

O ponto principal é que os volantes do Liverpool precisam fazer coberturas defensivas muito longas, percorrer muito campo e ter grande assertividade nos duelos, principalmente em pressão alta. O time inglês avalia que André não estaria pronto para fazer isso na Premier League.

Thiago Alcântara foi usado como exemplo. Mesmo sendo muito conhecido pela sua capacidade técnica, ainda sofre com a fisicalidade exigida pela Premier League e pela sua função dentro do elenco dos Reds. Isso, na avalição de ao menos parte dos envolvidos, poderia acontecer com André.

A saída de Klopp, no entanto, pode mudar a situação — ao menos em partes. Com um modelo de jogo diferente, menos intenso e que exigisse menos dos volantes, é possível que o jogo mude, mas isso não necessariamente indica que uma nova comissão técnica voltaria a demonstrar interesse no brasileiro.

André também jogou na seleção brasileira (Foto: CBF)
André também jogou na seleção brasileira (Foto: CBF)

Meio cheio em Fulham e West Ham

O Fulham, que segue há mais tempo nas tentativas de contratar André, também tem um “empecilho”: não vendeu quem deve ser o dono da posição do brasileiro, caso ele chegasse no elenco: João Pahinha.

O português quase foi para o Bayern de Munique em agosto e esperava-se que as conversas voltassem a acontecer em janeiro, mas nada avançou. Em nossa análise sobre o encaixe do brasileiro no Fulham, explicamos como seria complicado inserir André no time.

Na situação atual, é muito difícil que André banque Palhinha, uma força defensiva do time, ou o meio-campista do seu lado, o capitão Tom Cairney. Até mesmo Andreas Pereira, que atua mais à frente, poderia ser um concorrente a depender da disposição do meio. Alguém precisaria sair, o que não aconteceu.

O treinador dos Cottagers, Marco Silva, também falou que gostaria que a prioridade da janela fosse a chegada de um atacante. Por isso, o clube trouxe Armando Broja por empréstimo do Chelsea. A contratação de André também atrapalharia os planos do técnico.

Ainda em Londres, o West Ham também foi um interessado que não esperou por André e reforçou a posição com outro jogador. Foi Edson Álvarez, destaque do Ajax, quem chegou no início da temporada e dominou a posição. Agora, é difícil enxergar um encaixe para o brasileiro.

O mexicano é titular absoluto: começou 16 das 17 rodadas que disputou do Campeonato Inglês, além de três dos quatro jogos na Europa League. Ao seu lado, em um 4-4-2 clássico inglês, está um dos principais destaques do time há algumas temporadas: Tomas Soucek.

Além disso, o West Ham contratou recentemente o volante “esquecido” do Manchester City, Kalvin Phillips, que mais do que ocupar a vaga, tem um salário alto e deve receber mais oportunidades.

Casemiro pelo Manchester United (Foto: Icon sport)
(Foto: Icon sport)

Manchester United pode ser uma saída?

Desde o fim de 2023, Casemiro vinha sendo alvo de críticas no Manchester United pelo desempenho abaixo do esperado e viveu com lesões. Na época, foi cogitada até uma transferência do brasileiro para a Arábia Saudita.

Desde então, o volante voltou a ganhar moral e a possibilidade de deixar a equipe de Erik ten Hag praticamente desapareceu no momento, o que dificulta uma nova investida do clube por André.

Pode se entender que o jovem do Fluminense seria um substituto natural do veterano — tem, inclusive, conquistado seu lugar na seleção brasileira. Ainda assim, perto de fazer 23 anos, é possível que a joia brasileira já não tenha mais uma “paciência” ou tempo de maturação na Europa, e pode ser pedido para se apresentar em alto nível de imediato.

O Manchester United tem vivido problemas com o elenco: muitas lesões levaram a improvisações, um meio-campo ainda em aberto e um ataque pouco eficiente. Amrabat, que foi contratado no início da temporada, não resolveu o problema, enquanto McTominey, apesar de ser um dos artilheiros do time, não é tido como peça indispensável.

O “caos” dos Red Devils pode ser bom para André: uma reformulação iminente com a chegada do novo dono, Sir Jim Ratcliffe, significa que novos rostos devem aparecer e espaços podem ser abertos. No entanto, é incerto se o clube voltaria seus olhares a André novamente.

Diogo Magri
Diogo Magri

Jornalista nascido em Campinas, morador de São Paulo e formado pela ECA-USP. Subcoordenador da PL Brasil desde 2023. Cobri Copa América, Copa do Mundo e Olimpíadas no EL PAÍS, eleições nacionais na Revista Veja e fui editor de conteúdo nas redes sociais do Futebol Globo CBN.

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